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DISCURSO NA SOLENIDADE DE ABERTURA (*)
Ennio Candotti
Presidente da SBPC
Sra. Ministra Marina Silva, Ministra Nicéa Freire, nossos homenageados: Professora Glaci Zancan, Professor Caspar Erich Stemmer, caros colegas desta mesa da cerimônia de abertura. Meu caro Ministro Sérgio Rezende, agradeço as gentis palavras que acaba de proferir e que muito nos honram.
Gostaria de início lembrar o nome de um amigo ausente, o Professor José Leite Lopes, pessoa querida de todos nós e dedicar-lhe uma homenagem especial. Um minuto de silêncio. Leite faleceu há poucas semanas. Foi um grande mestre na ciência e na política e ainda é Presidente de Honra da SBPC.
O governador Eduardo Pinho em seu discurso intuiu nossas inquietações e nossa disposição de voltar às barricadas da ética e da vigilância política.
É verdade Sr. Governador, sua intuição corresponde à verdade.
O que vem acontecendo no país, a escalada de violência, nestes dias em São Paulo e anteontem no Pará, impressiona e mobiliza a indignação.
Devemos responder às agressões com firmeza. O que vem ocorrendo constitui uma séria ameaça ao próprio estado democrático. A resposta não pode ser violenta, devemos encontrar conselho e razão nos princípios do estado de direito e nos valores da convivência civilizada.
No caso da explosão de violência que está ocorrendo em São Paulo, os comandos agressores, os PCCs, constituem séria ameaça aos direitos humanos. Agem como um “pequeno Estado”, que, infiltrado dentro do nosso Estado, agride toda a sociedade.
A nossa resposta não pode ser ela também violenta. A violência não se combate com violência. É preciso usar inteligência, preparo e perseverança. Dar o exemplo de civilidade e buscar o apoio de toda a sociedade.
Não será através de violência maior, perseguindo e matando cidadãos indiscriminadamente, ferindo princípios fundamentais do estado de direito, que venceremos as agressões criminosas. Estamos convencidos que não haverá segurança sem a estrita observação dos direitos humanos e não haverá direitos humanos sem segurança.
Acredito que devemos concentrar nossos esforços para entender o que está acontecendo, quais são as raízes da violência. Somente assim a poderemos combater. Por que ainda não conseguimos superar o estado de violência? Isto é fundamental para consolidar nossa democracia e permitir que entre cidadãos a vida seja solidária.
Mestre Bobbio, lembra que há um salto qualitativo na história humana quando se passa do reino da violência para o da não violência. O salto do reino da necessidade para o da liberdade vem depois. Ele escreve:
“Creio firmemente que o único e verdadeiro salto qualitativo da história humana é a passagem não do reino da necessidade ao da liberdade, mas do reino da violência ao reino da não violência”.
Eu acredito que este salto é o desafio maior de nosso tempo. Não é apenas local, nosso. Guerras e violência devastam a vida de povos de história antiga, em extensas regiões do planeta.
Assistimos, indignados, aos horrores que ocorrem nas penitenciárias aqui e no mundo. O que está correndo na penitenciária de Araraquara, onde as portas foram seladas - com solda! - deixando os prisioneiros - muitos ainda sem julgamento concluído - sofrer e morrer em condições desumanas. Isso não se faz. Esta é uma agressão a toda sociedade. É de todo semelhante ao que acontece em Guantanamo, é semelhante aquilo que acontece nas prisões do Iraque, de Abu Ghraib.
Eu acredito que devemos lutar para que imagens como as do presídio de Araraquara não circulem pelo mundo. E, a única maneira para ter sucesso nessa luta é impedir que os horrores que lá ocorrem não aconteçam. É dar aos aprisionados tratamento digno e não permitir que as portas dos presídios sejam soldadas.
As marcas da violência não se encontram apenas nos presídios, elas se encontram nas ruas das cidades que aparentemente não estão em guerra, basta ler os estudos sobre a juventude que acabamos de premiar nesta cerimônia de abertura para verificar sua extensão.
Brasileiros jovens são as principais vítimas da violência que devasta nosso país. Sabemos que o maior número de mortes violentas ocorre entre jovens de 16 e 24 anos. Até quando seremos uma sociedade que devora seus próprios filhos?
O ano passado premiamos estudos sobre a condição da mulher. A denúncia não foi menos contundente. Como é possível que em 2006 ainda se questionem direitos fundamentais da mulher como, por exemplo, os direitos reprodutivos, contemplados em inúmeras convenções, amparadas por amplo consenso internacional.
Parece até que entre nós discute-se se a mulher tem ou não tem alma. Ainda se discute se ela tem consciência, se ela pode decidir a respeito de seu corpo, se quer ou não gestar um filho. Oras, isto é coisa que já se tinha imaginado superada, desde o século XIII, quando a Igreja Católica havia decidido que também a mulher possui uma alma.
E aqui ainda ouvimos no Congresso Nacional veementes discursos que procuram limitar a liberdade da mulher, a dignidade, a consciência, os direitos de decidir sobre suas faculdades reprodutivas.
Há problemas concretos muito sérios, sim, que exigem consenso e ponderação. Eles estão incendiando a sociedade, a comunidade acadêmica como, por exemplo, a questão das cotas e o estatuto e da igualdade racial.
São questões que devem ser discutidas em profundidade em nossa sociedade. Alguns perguntaram: mas afinal, a SBPC é a favor ou contra as cotas? A nossa resposta é bastante simples: nós somos a favor de um entendimento da sociedade brasileira para que se encontre um estatuto de igualdade racial e igualdade social, de dimensões mais amplas, um estatuto que una e não divida.
Nessa batalha não pode haver vencedores e vencidos, é disto que nós temos que nos convencer. Não é questão das cotas e do ingresso nas universidades. Por favor, a questão das cotas universitárias é um problema secundário.
Há universidades que já resolveram isto de maneira inteligente, criativa e que funciona. A Ministra Nicéa Freire, quando Reitora da UERJ, foi pioneira na introdução de cotas e mostrou que a questão pode ser resolvida de modo eficaz e mesmo sereno.
Quanto ao estatuto da igualdade racial, acreditamos que ele precisa ser repensado, precisa encontrar maior sintonia com nossa sociedade. O problema ‘racial’ existe, ele não é de natureza científica mas cultural. Preconceitos e discriminações ocorrem em uma sociedade profundamente marcada pelo passado escravocrata e pela profunda desigualdade de oportunidades econômicas e educacionais entre brasileiros.
A SBPC se coloca à disposição de todos os interlocutores para que este entendimento seja alcançado. Ele é necessário, precisamos dele para vencer outras batalhas, muito mais complexas como a da violência, da justiça e da educação que temos pela frente.
Perguntei a um advogado amigo quantas leis existem no Brasil. Ele me disse: já estamos em 140 mil. Observando que umas 70 mil já não funcionam mais, sobram 70 mil.
Com 70 mil leis, todos nós somos réus de alguma coisa. Até mesmo respirar deve encontrar na legislação alguma restrição.
A revisão profunda destas leis, a redução de seu número, a sua adequação ao mundo moderno, é fundamental. Não haverá desenvolvimento científico em nosso país, não haverá vida inteligente se continuar a vigorar todas estas normas e leis que procuram disciplinar o pouco que sabemos e principalmente o que não sabemos nas relações com a natureza.
Recentemente, vemos que bem intencionados, procuradores, legisladores, agentes do Ministério Público têm se preocupando com questões da ciência, de riscos e propriedade intelectual, com a defesa do patrimônio genético e com a biopirataria.
Há pouco tempo, a Sra Ministra do Meio Ambiente sabe quantas dores de cabeça nos deram as investidas fiscalizadoras, de agentes da polícia federal e do nosso indomável IBAMA, em laboratórios de pesquisa onde ameaçam prender cientistas caso não tenham a devida autorização para trabalhar com plantas ou animais, vertebrados ou invertebrados.
A Ministra sabe quantas vezes a procurei em seu gabinete, pedindo, por favor, para simplificar a legislação que regula o acesso à nossa biodiversidade. Precisamos fazer com que todos os jovens estudem as formigas, colham frutos, retirem folhas. Precisamos de naturalistas, de entomólogos, botânicos. Sabemos muito pouco sobre nossa fauna e flora. É claro que poderíamos deixar tudo com está e observar a natureza à distância, mas desta forma não faremos ciência.
Vivemos em um planeta em que vemos, a olho nu, apenas uma pequena parte, pequeníssima, do mundo animado que nos cerca. Os microorganismos não são vistos mas existem e contam-se aos bilhões. Como vamos estudá-los? Vamos pedir ao Ministério Público permissão para transportar nossa saliva - que contém centenas de milhares de microorganismos - de um local para outro? Seremos presos por ter alguns piolhos na cabeça e levá-los para a Europa? As restrições hoje presentes na legislação são absurdas, elas precisam de profunda reforma.
Ainda há pouco a Sra. Ministra Marina Silva me dizia que está sendo preparado um novo estatuto para regulamentar o acesso à biodiversidade. Conceitos como os de biopirataria, estão sendo repensados. Mas, tenho notícia também que o acordo alcançado entre o Ministério de Ciência e Tecnologia e do Meio Ambiente não foi suficiente para redigir um novo estatuto legal. Desta vez, foi o Ministério da Agricultura a discordar e paralisar os trabalhos.
Quanto tempo mais vamos perder? Até quando as reuniões da CTNBio serão vigiadas pelo representante do Ministério Público? Um Ministério Público que – pelo que se sabe - nunca vigiou as reuniões do Conselho de Política Monetária cujas resoluções têm enorme influência na vida dos brasileiros.
Por que logo considerar que um Conselho técnico, formado por cientistas está tão mal intencionado que precisa de um tutor? De alguém que verifique se a lei está sendo obedecida.
Isso nos obriga a mostrar aos legisladores e à sociedade que não há normas seguras e rígidas a seguir no campo da biossegurança. É preciso muito bom senso.
Não podemos enquadrar a nossa ignorância na lei. Precisamos, antes de definir normas rígidas, superar esta ignorância. Por mais que os legisladores não se convençam não é possível transformar as leis da natureza em leis do código civil. Tanto mais as que se desconhecem. A lei da gravidade não cabe na Constituição.
È difícil explicar que uma barra de ferro não é necessariamente um porrete, uma arma perigosa. Ela pode ser uma alavanca. Pode sim. Mas, nos códigos dos tribunais ela é objetivamente classificada como uma barra de ferro, com peso e comprimento e seu uso, em determinadas ocasiões, tem efeito contundente.
O fato que com esta barra de ferro eu posso levantar um peso muito grande não está contemplado pela legislação.
Nós queremos colaborar com os legisladores, queremos sim colaborar com toda a sua equipe, Sra. Ministra, para fazer com que nós, cientistas, sejamos parte das soluções e não parte dos problemas do Ministério do Meio Ambiente.
Um dos grandes desafios da conservação dos ambientes naturais é o conhecimento da natureza. Valor somente pode ser atribuído ao que se conhece. Patrimônio deve ser inventariável. Não serão fiscais que estabelecerão seu valor. Não serão guardas-florestais que impedirão o trânsito de lagartixas pelas fronteiras.
Sem dúvida, ao estudar e conhecer os segredos da vida, da fauna e da flora, poderemos sim encontrar meios para protegê-la e explorá-la antes que outros o façam. A biopirataria deve ser combatida com armas do conhecimento, da pesquisa científica, eu diria mesmo que aos biopiratas deveríamos contrapor biocorsários.
Os corsários foram inventados pela rainha Elizabeth para combater os piratas. Eles eram piratas a serviço da rainha. Os resultados de suas ações enriqueceram a Inglaterra. Nós precisamos de corsários - cientistas.
O que deveria mesmo ser proibido é impedir o estudo da natureza. Este deveria ser o nosso mote. É proibido proibir o estudo da natureza. Se houver alguns excessos, divergências sobre o uso das biotecnologias, ilusões na exploração da biodiversidade, vamos discuti-las, mas vamos discuti-las com a determinação de encontrar um acordo, de resolvê-las.
Foi isto que aconteceu ao longo de todos estes séculos em que o conhecimento progrediu e chegamos onde chegamos. Com defeitos e virtudes, riscos e benefícios. Em nossa sociedade a ciência é vista com temor, desconfiança, isso deve ser corrigido, precisamos explicar a todos que a ignorância é um fator de risco maior e que a devemos vencer. É ela que alimenta a violência.
Eu diria que a violência, que observamos nas terras da Amazônia, se deve em boa parte à nossa ignorância, ao fato que dela conhecemos muito pouco. Podemos dizer: esta arvore é uma verdadeira biblioteca, contém valiosas informações! Mas ainda mal sabemos decifrar a linguagem em que estão escritos os livros desta biblioteca!
Uma árvore vale muito mais do que os metros cúbicos de sua madeira. Não conseguimos dizer isso a quem compra essa madeira. É verdade, e isso se deve ao fato que não sabemos ler os livros desta biblioteca. Não sabemos decifrar seus segredos. Devemos confessar: não sabemos. Nem sabemos direito como a seiva chega até a copa de uma árvore muito alta.
Preservar a floresta não é apenas um ato de conservação de uma natureza que se tem demonstrado generosa conosco, mas não se trata apenas de um ato de solidariedade. É também. É, antes de mais nada, uma necessidade para que um dia seja possível conhecê-la.
Tenho certeza de que no dia em que soubermos como funciona uma árvore, como cresce e se estende uma floresta seremos uma outra civilização. Mas para chegar lá, precisaremos estudar árvores e florestas. É neste sentido, que devemos entender o papel da educação. Ela deve ser o objetivo máximo da mobilização de nossa sociedade.
Esperamos que a educação esteja presente e ocupe um lugar de destaque nos programas dos candidatos à presidência. Não tenho dúvidas que votaremos em quem der mais ênfase à educação, à educação básica, à educação média, à universidade.
A educação média precisa de muito apoio. Precisamos não apenas de educação, mas saber o que fazer com a educação. Precisamos de educação para, por exemplo, reescrever e reduzir a um número razoável as 60 mil leis que paralisam o país. Para poder dizer às nossas crianças que existe sim um mundo inteligente a ser construído. Precisamos dizer a elas que tenham coragem de contar o que sabem e também o que não sabem. Que defendam os seus direitos e também os de todos, à cidadania.
É isto é o que nós queremos com a educação. Uma educação que esteja atenta aos direitos humanos e que pense nos seres humanos como seres capazes de decifrar e entender o mundo que os cerca.
Há alguns exemplos e símbolos desta batalha pela educação e compreensão do mundo que é dos nossos dias. Quinta-feira fará uma conferência aqui nesta Reunião a arqueóloga Niède Guidon, que há 35 anos trabalha na Serra da Capivara, no Piauí, onde existe um sítio arqueológico importantíssimo e também um parque do IBAMA que abriga este sítio. Ela está estudando as nossas origens.
Lá existem registros de uma ocupação humana de mais de 20, 30 e talvez 40 mil anos. Se isto for verdade, se ela e suas equipes de arqueólogos conseguirem consolidar as provas recolhidas até o momento, e ela está avançando nesta direção, toda a teoria da ocupação humana das Américas será revolucionária.
É muito importante que estes sítios, onde encontramos registros de nossas origens, de nosso passado, marcas antigas da presença humana em nossas terras, sejam preservados.
Na verdade este sítio, infelizmente, está sendo destruído. Niède lançou um último grito. Ela diz que abandonará o sítio se este mês ela não puder pagar os salários de seus colaboradores. Não tem mais dinheiro nem para a gasolina dos jipes para percorrer os laboratórios naturais que, com tanta fadiga, construiu.
Ela virá aqui e todos nós pediremos para ela resistir. Vamos pedir que resista mais um pouco porque, tenho certeza, conseguiremos os recursos necessários e o parque poderá ser preservado. As grutas e as pesquisas que ela está realizando sobreviverão. Mas para isto, contamos com o apoio tanto do Ministro Sérgio Rezende como da Ministra Marina Silva.
Eu sei que há outros parques que estão em perigo, talvez até maiores do que este, mas este é exemplar, ele é fruto de mais de 30 anos de perseverantes pesquisas e dedicação contínua em condições adversas. É essa dedicação que fez a ciência atravessar séculos e hoje nos permite dizer que nos conduzirá para muito longe.
Há outros exemplos, nestes últimos dias, irados cidadãos, sinceros, mas não menos irados: acusam pesquisadores de usar práticas violentas contra animais em laboratórios.
Eu respondo que os pesquisadores há muitos anos estabeleceram normas rigorosas de intervenção e de uso de animais em laboratório e sempre se procura minimizar sofrimento ou dor aos animais.
No entanto, há pouco me dizia o biólogo Osvaldo Sant’Anna, membro da diretoria da SBPC, que ele precisará ir a São Gabriel da Cachoeira coletar serpentes. Acho que são jararacas, mas não sei se estou certo. Isso porque o soro hoje produzido no Butantan não tem o efeito desejado naquela região, nas vítimas das mordidas por estas cobras e será preciso coletar jararacas de lá e colher novas informações sobre o seu veneno.
Osvaldo me diz que não consegue a autorização do IBAMA para a coleta. Enquanto isso, vidas humanas são sacrificadas.
Deveríamos deixar as cobras em paz? Como, se temos um compromisso com nossos semelhantes de produzir medicamentos capazes de protegê-los das picadas dessas cobras? Devemos sacrificar nossos semelhantes para não interferir na vida das comunidades rastejantes, também chamadas de cobras. Eu insisto. Precisamos de bom senso para permitir que a ciência cumpra seus compromissos éticos e sociais.
Podemos sim proteger a vida humana e minimizar a intervenção na natureza, mas um pouco de intervenção é necessária. Precisamos intervir e arriscar um pouco. Eu sei que a CTNBio pode aprovar pesquisas que não correspondam às precauções mais severas, mas na história da humanidade quantas pesquisas não deram certo antes de alcançar aquelas que foram bem sucedidas.
A capacidade de avaliar risco e beneficio é o que se aprende na escola. É lá que aprendemos a pesar, a escolher o que convém e o que não convém. O bom senso se cultiva na escola, na universidade e nas reuniões da SBPC, quando elas são suficientemente interdisciplinares.
Isto para que os participantes possam confrontar suas preocupações, ver os seus objetos de estudos de diferentes pontos de vista, atribuir valores e emitir juízos sobre o que estão fazendo eles e outros nos laboratórios de pesquisa.
Finalmente, eu gostaria de lembrar que muitas coisas estão dando certo nestes tempos conturbados. Até mesmo na educação, há um esforço imenso de divulgação científica que vem ocorrendo nos últimos anos. Há poucas semanas o comitê do CNPq que julgou os pedidos e solicitações de apoio para divulgação científica recebeu nada menos do que 100 milhões de reais de pedidos de auxílios a projetos. Tinha apenas 7 milhões para distribuir. Um para dez. Ganhou de todos os outros comitês. Poderíamos atender, com qualidade, bem mais do que se atendeu.
Eu tenho certeza que crescendo como vem crescendo o investimento em divulgação científica, em breve alcançaremos os 100 milhões. Por que? Porque há poucos anos investia-se muito pouco em divulgação científica. O ano passado a situação melhorou. Este ano conseguimos muito mais e tenho certeza que até o final do ano o Ministro Rezende encontrará alguns recursos adicionais para esse programa.
É preciso explicar a todos que a ciência não é inimiga da sociedade, não é fonte de riscos e que suas aplicações de fato podem aliviar a fadiga humana Ela não é um problema a mais na vida dos mais humildes. A ciência pode, para muitos, trazer soluções para angustiantes problemas. A essa missão dedicamos nossas melhores forças, com grande generosidade.
Combatemos e vencemos o obscurantismo das piores tiranias para chegar aos nossos dias. Sem ilusões de que a ciência resolverá todos os problemas do mundo, conservamos nossos espíritos críticos, conscientes das nossas responsabilidades morais.
Lembro de outro bom exemplo de sucesso ao ver Suely Druck, matemática e também membro da diretoria da SBPC: as olimpíadas da matemática das escolas públicas que mobilizaram cerca de 14 milhões de jovens. Perguntas e problemas de matemática alcançaram os quatro cantos do país, e todas as escolas os discutiram, nas olimpíadas e depois delas. Mostraram com isso que, oferecendo algum oxigênio e novas idéias, se os procuradores e AGUs (Advocacia Geral da União) permitirem, formaremos em breve mais matemáticos e talvez menos advogados.
Há muito poucos matemáticos, como há poucos engenheiros. No entanto, há muitos advogados. Talvez a razão disso se deva ao fato que precisamos deles para nos proteger das 50 mil leis. Na Alemanha, estão em vigor cerca de 7 mil leis, e o número de advogados por mil habitantes é muito menor do que no Brasil. Lá há mais matemáticos e engenheiros do que aqui.
Finalmente, quero dizer que trago a Santa Catarina e ao seu Governador, Eduardo Pinho, um presente. Um presente importante. E ao Reitor da nossa Universidade também. Trata-se de um projeto e um financiamento para construir uma Oficina de Ciências e Artes. Uma OCA.
O Ministério da Ciência e Tecnologia e a Finep ofereceram alguns recursos para construir, em Florianópolis, uma casa onde abrigar as idéias de educação em ciências e artes que movem a SBPC, as idéias de interdisciplinaridade, de educação, de direitos humanos que mencionei. Uma casa que possa ser freqüentada pelos jovens alunos das escolas básicas e seus professores.
De fato, Sr. Governador, eu o procurei nesta semana para lhe anunciar o presente, mas confesso que não consegui agendar uma audiência. Soube depois que o Senhor se encontrava no exterior!
O que é uma oficina de ciência e arte? É um local onde se realizam todas aquelas atividades que não podem ser realizadas nas escolas, como a reunião da SBPC é o local onde se realizam atividades que a universidade não consegue programar com continuidade durante o ano todo. É um local onde se pode reunir laboratórios de ciências, computadores, salas de dança e de música, de física e química. E lá, levar os alunos interessados em aprender e lidar com as coisas da ciência e da arte.
Nas OCAs poderíamos reunir equipes especializadas de técnicos, professores e monitores que poderiam garantir o bom funcionamento das oficinas e o seu pleno aproveitamento por professores e alunos. O Ministério da Educação; Ministério da Ciência e Tecnologia; Ministério do Meio Ambiente e a Secretaria da Mulher estão convocados a colaborar com o projeto.
Encontram-se a vossa disposição, Sr. Governador, Sr. Reitor, 600 mil. Só não os trouxe em minha mala porque, não fica bem carregar dinheiro em malas e o Professor Odilon Marcuzzo, Presidente da FINEP, antes de liberar os recursos gostaria de saber o que vocês acham do presente e se o Governo do Estado está disposto a colocar à disposição do projeto alguns recursos e algum casarão onde abrigá-lo.
Senhores, falei demais. Quero que todos tenham uma ótima Reunião. Participem, perguntem. Não deixem de questionar. Continuem questionando mesmo depois que os trabalhos desta Reunião se encerrarem. Tenho absoluta certeza que estas perguntas, como a SBPC, serão lembradas ainda por muito tempo nas vossas mentes e corações. Isso já acontece há 58 anos.
Obrigado a todos pela atenção.
(*) Transcrição dos registros audiovisuais de Maristela Garmes.
O texto da transcrição foi revisto e editado por Ennio Candotti.
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