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 Sessão de Abertura


Discurso da Presidente da SBPC
Helena Bonciani Nader
 

Caros colegas, professores e estudantes,

Senhoras e senhores, meus amigos,

Esta reunião acontece graças ao trabalho, empenho e apoio de centenas de pessoas das diferentes entidades envolvidas. Assim, quero agradecer a todos pela presença, a começar pelas autoridades que nos honram por estarem aqui.

Agradeço ao apoio de nossas agências de fomento, CAPES, CNPq, FINEP, FAPESP, aos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação, e da Educação, à Fundação Conrado Wessel, Veracel Celulose, entre outros.

Meu agradecimento especial ao reitor da Universidade Federal do Sul da Bahia, professor Naomar Almeida Filho, em nome de quem agradeço a todos os professores, funcionários e estudantes da UFSB, pela parceria e apoio na realização desta nossa reunião anual. Graças ao empenho do professor Naomar foi possível reunir mais 8 universidades e instituições de ensino superior públicas da Bahia, como parceiras na organização deste encontro.

Meus agradecimentos à professora Cláudia Levy, secretária geral da SPBC e coordenadora geral desta reunião, e a todos que trabalharam para que pudéssemos estar aqui agora.

Agradecimento   especial   ainda   aos   membros   da   diretoria   e   aos funcionários  da  SBPC  pela oportunidade  do  trabalho  em  equipe.  Assim,  em nome da Fernanda agradeço a todos os funcionários que trabalharam diuturnamente na gestão e na infraestrutura desta reunião. Ao Luiz Dionísio e equipe pela realização da EXPOT&C, e infraestrutura da SBPC Jovem, Cultural, inclusive construção das ocas. Em nome da Fabíola, a todos da comunicação voltados a divulgação e cobertura da reunião. A querida Nicinha nossa chefe de gabinete pela calma e tranquilidade com que resolve os problemas do dia a dia.

Meus agradecimentos mais do que especiais aos professores, estudantes e cidadãos de Porto Seguro e região que nos acolhem e vêm aqui nos prestigiar.

Assim, é com imensa alegria que chegamos hoje a Porto Seguro para dar início a 68ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Alegria por estar aqui com vocês, estudantes, professores, pesquisadores e autoridades   de   diversas   regiões,   no   ambiente  salutar  da   mais   jovem Universidade Pública Brasileira, para debater sobre ciência, tecnologia, inovação e educação. A luta pelo desenvolvimento destas áreas é a razão de ser da SBPC.

Mas a alegria deste momento não exclui a necessária visão crítica sobre o que acontece hoje no Brasil e no mundo. O último ano, desde que realizamos a 67ª Reunião anual da SPBC, na Universidade Federal de São Carlos, no interior de São Paulo, foi excepcionalmente difícil para todos nós brasileiros. Um ano que deve entrar para a história como um período dramático na vida social, política e econômica do país. Foi e está sendo difícil para a educação e a ciência.

Quando olhamos para fora vemos um mundo onde, apesar de todos os avanços científicos e tecnológicos, apesar da globalização, que parecia ser a esperança de uma sociedade mais pacífica, interligada e tolerante, o que se vê são conflitos de toda ordem. Intolerância com a diversidade de gênero, raça e religião, violência urbana, diásporas e terrorismo.

A recente aprovação da saída do Reino Unido da União Europeia, por meio do voto popular, é um exemplo claro de como grande parte da sociedade não está disposta a continuar vivendo em meio à complexidade de um mundo com menos fronteiras. A intolerância com os imigrantes convive com o medo da fragilidade econômica, que produz o desemprego em larga escala em vários pontos do planeta.

É muito difícil fazer julgamentos claros e uníssonos quando se tem sociedades tão divididas. Infelizmente, vemos o mesmo ocorrendo no Brasil. Com outras cores, mas com consequências semelhantes. A crise política e a descoberta de um sistema organizado de corrupção no meio empresarial e político dividiu a sociedade de uma maneira negativa, que em nada contribui com a busca por saídas que levem o país de volta ao crescimento, à educação universal e com qualidade, ao desenvolvimento científico e tecnológico em prol de uma nação mais justa, que busca o bem estar de todos.

A SBPC tem uma longa trajetória de luta pela democracia e pela garantia do estado de direito. Foi assim que nos posicionamos firmemente contra a ditadura militar, quando professores, estudantes e cientistas estavam sendo perseguidos, torturados ou exilados do país. Entendemos que o momento atual também requer posicionamento firme da SBPC. Fomos protagonistas do movimento nacional de luta contra a fusão do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, com o Ministério das Comunicações, movimento este que inclui as universidades, os centros de pesquisa e demais sociedades científicas.

A criação de um ministério dedicado a pensar e gerir a ciência brasileira remonta ao início da década de sessenta por iniciativa de um grupo de cientistas liderados pelo grande físico brasileiro Leite Lopes. O sonho se concretizou em
1985, há exatos 31 anos. Não podemos ter retrocessos, pois acreditamos que somente com ciência e tecnologia fortes, associadas à educação de qualidade poderemos conquistar o país que queremos - justo e igualitário, com forte desenvolvimento econômico, sustentável e social.

No  entanto,  é  preciso  que  fique  claro,  buscamos  ao  longo  de  nossa história manter um canal de diálogo aberto com os poderes públicos, pois são as políticas e os recursos públicos que garantem a continuidade e a evolução da Educação e da CT&I no Brasil. O diálogo é necessário até mesmo para que nossas críticas e reivindicações sejam ouvidas, enquanto vivemos em uma república, e não em um regime de exceção, como foi no passado.

É  com  este  espírito  republicano  que  nos  encontramos  hoje  em  Porto Seguro, no sul do estado da Bahia, cidade que compartilha, com os municípios limítrofes  de  Santa  Cruz  de Cabrália  e  Prado,  a  primazia  de  ser  o  local  de chegada dos portugueses ao Brasil em 1500. O vilarejo que deu origem ao município de Porto Seguro foi fundado em 1534 e está tombado em quase sua totalidade pelo patrimônio histórico.

A  relevância  histórica  de  Porto  Seguro,  aliada  às  belezas  naturais  da região, transformou o município, durante as últimas décadas, em um dos principais polos turísticos do Brasil. Aqui chegam milhares de pessoas em busca de sol e belas praias, mas também de uma região que preserva os ares de um passado histórico visível na arquitetura e no modo de vida da população, dos pescadores, dos povos indígenas, e do artesanato local.

Essa cidade que assistiu à chegada dos colonizadores portugueses abriga, desde o ano passado, o mais novo espaço da Universidade do Sul da Bahia (UFSB), o campus Sosígenes Costa onde nos encontramos hoje. A UFSB foi criada por decreto presidencial em 5 de junho de 2013, com um projeto político- pedagógico que inclui um marco conceitual bastante inovador, inspirado em grandes pensadores modernos, sobretudo Anísio Teixeira, Paulo Freire, Milton Santos, e Pierre Lévy. Fomentar paz, equidade e solidariedade entre gerações, povos, culturas e nações, é um dos pilares fundamentais que constituem esta universidade.

É nesse ambiente de elevado estímulo ao desenvolvimento e à democratização do conhecimento e dos saberes, que a SBPC realiza a sua 68ª Reunião Anual. Acreditamos que o sucesso do evento está em grande parte garantido por todos esses aspectos favoráveis da UFSB e de seu entorno, como também pelo comprometimento imprescindível demonstrado, desde o início, pela equipe organizadora local sob a coordenação do professor Carlos Alberto Caroso Soares (UFSB). Essa comissão atuou com eficiência e dedicação, decidida a planejar e fazer acontecer todo o necessário para garantir que será essa uma reunião de grande sucesso e repercussão, sempre com o apoio incondicional do Reitor Naomar Almeida Filho (UFSB) idealizador desse modelo de universidade inserida e com forte participação da comunidade.

As reuniões anuais da SBPC são, em verdade, a soma de um conjunto de eventos, cada qual com seu jeito e programação próprios. Não bastasse contarmos a alguns anos com uma já repleta diversidade de eventos, continuam surgindo   novos.   Desde   a   66ª   Reunião,   realizada   em   julho   de   2014   na Universidade Federal do Rio Branco, no Acre, tivemos a SBPC Indígena e, em caráter pioneiro, o Dia da Família na Ciência. Dado o êxito de ambos, eles passaram a integrar a programação das reuniões anuais.

Antecedendo a este nosso evento, aqui em Porto Seguro, aconteceu a SBPC Educação voltada para cerca de 1.200 professores do Ensino Básico, na Universidade Estadual do Sul da Bahia (Uneb) campus Teixeira de Freitas, como parte da nossa 68ª Reunião Anual da SBPC.

Com a presença expressiva de representantes das aldeias indígenas da região, a SBPC Indígena terá um espaço novo e surpreendente, um conjunto de ocas onde serão realizadas 26 atividades, entre conferências, mesas-redondas, sessões especiais, minicursos e oficinas, além de atividades artísticas e culturais, com mostras de arte e artesanato indígena.
Ainda nesta reunião, como não podia deixar de ser em um estado do nosso país que respira arte e cultura nas suas diferentes formas, teremos pela primeira vez a SBPC Artes.

Além dessas novidades, a 68ª Reunião Anual da SBPC terá a tradicional programação científica sênior com um total de mais de 200 atividades, incluindo conferências, mesas-redondas, minicursos, encontros e sessões especiais, apresentação de pôsteres, SBPC Jovem, SBPC Cultural e a EXPOT&C, com uma mostra de ciência e tecnologia. O tema central da reunião deste ano – sustentabilidade, tecnologias e integração social – está estreitamente ligado à realidade da UFSB e seu entorno.

Aproveito este momento para compartilhar com vocês algumas inquietações sobre os rumos da educação, da ciência e da tecnologia em nosso país, bem como algumas conquistas.

Nos   últimos   anos   temos   repetido   que   o   financiamento   a   ciência, tecnologia e inovação permanece como uma das grandes preocupações da comunidade acadêmica e científica. Nossa luta continua pela reposição do orçamento pelo menos aos níveis do ano de 2013, já que não podemos pensar num estado soberano sem CT&I.

A situação visivelmente de penúria em que se encontram muitas das Universidades Públicas Brasileiras, tanto Federais como Estaduais. Nos últimos meses temos assistido às mais diversas formas de manifestações contra as limitações de verbas para atender a emergências tão aparentemente simples como a garantia da limpeza dos campi universitários, ou, na outra ponta, o acesso a materiais de insumo para pesquisas.

Embora essas e outras manifestações sejam justas e necessárias, não podemos concordar com o estado permanente de greves que ocorrem em todo o país, em muitos casos inviabilizando que professores e estudantes possam proferir e participar das aulas. É preciso recuperar o diálogo, para que as instituições de ensino possam funcionar com um mínimo de regularidade.

Os  cortes  provocados  pelo  ajuste  fiscal  estão  também  atingindo  os Estados da Federação, nos quais secretarias, antes dedicadas à CT&I, são anexadas a outras, ou simplesmente extintas.   As Fundações de Amparo à Pesquisa igualmente sofrem cortes em seus orçamentos.

Temos assim um conjunto de deficiências no nosso sistema educacional e científico, que precisa ser sanado com a urgência de uma fratura exposta.

Se a fragilidade das contas públicas aflige a economia, a fragilidade do sistema  educacional,  científico  e  tecnológico  provoca  danos  profundos  e  de longo prazo não só na vida econômica, mas também na sociedade como um todo e na maioria dos cidadãos, especialmente os de baixa renda. Devemos lutar para que o diálogo e o combate coerente voltem a prevalecer.

Em meio a estas preocupações e lutas, temos algumas conquistas a comemorar.  Como exemplo destaco o  Marco  Legal  da Ciência, Tecnologia e Inovação,  sancionado  como  Lei  Federal  no dia  11  de  janeiro  deste  ano.  A atuação da SBPC na formulação e aprovação do marco foi um dos principais destaques nesse período. A luta pela derrubada dos vetos presidenciais que atrapalham  e  judicializam  a  prática  da  ciência,  tecnologia  e  inovação  tem marcado o nosso posicionamento nos últimos meses. Como forma de alavancar e fortalecer o marco legal da CT&I temos proferido palestras em várias cidades, instituições e universidades pelo país.

A SBPC também participou ativamente na formulação, acompanhamento ou reivindicação de outras proposituras federais e estaduais. Destaques são a regulamentação da lei de acesso ao patrimônio genético e aos conhecimentos tradicionais  associados.  Infelizmente,  a  comunidade científica  não  foi  ouvida pelo Ministério do Meio Ambiente, que de forma unilateral regulamentou a legislação, que terá impactos negativos para a ciência, a tecnologia e a inovação. Cabe lembrar que a SBPC participou de forma clara e ativa da discussão, que ao final não levou em consideração os pontos fundamentais levantados pelos pesquisadores. Participamos ainda ativamente da discussão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e esperamos que o projeto seja encaminhado diretamente ao Conselho Nacional de Educação, o CNE, como previsto, e não ao Congresso Nacional como vem sendo divulgado. Ainda, em elação à educação básica,   somos  frontalmente   contra   todos   os   projetos   que   direta   ou indiretamente preconizam a interferência do estado na sala de aula, pregam a intolerância e defendem teorias absurdas e anticientíficas, como o criacionismo.

Participamos ativamente da discussão da polêmica sobre o uso da fosfoetanolamina, a chamada pílula do câncer; do marco civil da internet; da ameaça de extinção e limitação de recursos de fundações de amparo à pesquisa. Posicionamo-nos frontalmente contra a PEC 143/2015, que propõe alterar “a constituição federal, para estabelecer que são desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 2023, 20% da arrecadação dos impostos dos estados e dos municípios,  e  dos recursos  que  cabem  aos  estados  e  aos  municípios  na repartição das receitas de impostos da união”.

Somos frontalmente contra a proposta de emenda constitucional que foi anunciada pelo governo interino que estipula um limite para o gasto, alterando os mínimos constitucionais para as pastas de Saúde e Educação. Assim, o recurso para essas áreas deixaria de ser vinculado à Receita Corrente Líquida e passaria a ser corrigido apenas pela inflação. Vamos continuar na luta pela volta do MCTI com financiamento pelo menos nos níveis de 2013, entre muitas outras.

Para encerrar lembro que esta reunião anual presta homenagem a dois cientistas que nos deixaram recentemente, e que participaram ativamente da nossa sociedade. O químico Angelo da Cunha Pinto, professor titular da UFRJ, um  dos maiores especialistas nacionais e internacionais na área de Química de Produtos Naturais, que dedicou sua vida à pesquisa e à divulgação da química; e o médico e professor titular de cirurgia da UNESP, William Saad Hossne, que além  da carreira  dedicada  a  Medicina,  à ciência  e  à  gestão  de  ciência,  é conhecido por todos como o Pai da Bioética no Brasil. Aqui abro parênteses para citar parte de uma mensagem que recebi de Laura Olivatto, estudante de medicina da EPM, após a palestra do Prof. Saad na reunião da SBPC no ano passado:   “Particularmente, uma das minhas conferências  favoritas   foi   a realizada pelo Dr. William Saad Hossne na sexta-feira. Durante toda a sua fala, não desviei minha atenção de sua explanação por um segundo, tamanha é sua primazia ao apresentar a temática da Bioética para os ouvintes.”

Como referência ao grave momento que vivemos, penso que podemos olhar para o passado e ver que, apesar de tudo, temos conseguido avançar. Nada mais exemplar da tristeza de nosso passado, do que o poema “O Navio Negreiro”, do poeta revolucionário que dedicou sua breve vida às lutas de seu povo, Antônio Frederico de Castro Alves, baiano de Muritiba, e patrono da cadeira nº 7 da Academia Brasileira de Letras.

Era um sonho dantesco… o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros… estalar de açoite…
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar…
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Existe um povo que a bandeira empresta
P’ra cobrir tanta infâmia e cobardia!…
E deixa-a transformar-se nessa festa
Em manto impuro de bacante fria!…

Meu Deus! Meu Deus! Mas que bandeira é esta,
Que impudente na gávea tripudia?
Silêncio. Musa… chora, e chora tanto
Que o pavilhão se lave no teu pranto!…
Auriverde pendão de minha terra,
Que a brisa do Brasil beija e balança,
Estandarte que a luz do sol encerra
E as promessas divinas da esperança…

Encerro aqui, com uma frase da paulista bahiana Zélia Gattai “Continuo achando graça nas coisas, gostando cada vez mais das pessoas, curiosa sobre tudo, imune ao vinagre, às amarguras, aos rancores” e outra do nosso querido ícone Jorge Amado "Eu sou muito otimista, muito. O Brasil é um país com uma força  enorme.  Nós  somos  um  continente,  meu  amor.  Nós  não  somos  um paisinho, nós somos um continente, com um povo extraordinário."

Meus votos de esperança, desejando a todos uma excelente reunião.

Muito obrigada.

 
 
 

 

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