65ª Reunião Anual da SBPC |
H. Artes, Letras e Lingüística - 4. Linguística - 1. Linguística Aplicada |
OS TEXTOS DE HUMOR E AS AULAS DE PORTUGUÊS: UM EXERCÍCIO IDEOLÓGICO. |
Alexandre Duarte Gomes - Prefeitura da Cidade do Recife Cristiane de Souza Castro - Prefeitura da Cidade do Recife |
INTRODUÇÃO: |
A língua é um modo de fazer ideológico. Com ela e por ela, construímos, reconstruímos, perpetuamos e finalizamos situações sociais e históricas. Assim, a prática pedagógica da língua portuguesa tem que ser um exercício de reflexão acerca das cosmovisões postas na dinâmica social (cf. Irandé, em Língua, texto em ensino). Posto isso, os gêneros textuais, base de uma efetiva prática do ensino da língua, devem ser encarados como mecanismos de leitura do mundo. E que mundo temos através dos gêneros humorísticos? Como os programas televisivos de humor, os “stand-up” dos palcos diversos, as piadas veiculadas na Internet se referem à realidade social? Sírio Possenti assevera tanto em “Os humores da língua”, como em “Humor, língua e discurso” que muitos dos textos de humor vão trabalhar com simulacros, os quais, em última instância, tem natureza preconceituosa. Assim, merecem reflexão os altos índices de audiência dos programas televisivos de humor, a plenitude de lotação dos teatros que exibem “stand-up”, o grande acesso às piadas da Internet. Enfim, a escola, nas aulas de português, tem que convocar os alunos a refletirem sobre do quê, por quê, de quem eles estão sorrindo, rindo. Tentar com eles verificar se, atrás de um largo riso, não está uma espessa lágrima. |
OBJETIVO DO TRABALHO: |
Evidenciar como, em textos de humor, muitas vezes, há uma organização textual – quer por intermédio das palavras, quer de outros signos – que desqualifica identidades e atos de certos segmentos sociais. Assim, fazendo com que os alunos sejam capazes de, mais criticamente, produzirem/compreenderem tais textos. |
MÉTODOS: |
Assumimos uma perspectiva sociointeracionista de língua na nossa prática pedagógica, assim também o será na feitura desse projeto de intervenção pedagógica. Dessa forma, evidente fica que buscamos a construção de alunos-indivíduos capazes de vislumbrar a língua como algo inacabado, como coisa que se constrói, indefinidamente, na e para a realidade social e histórica. Posto isso, e tendo em vista o objetivo deste projeto de caráter qualitativo e quantitativo, assim estruturamos os procedimentos ideológicos: . Interação dos alunos com textos de humor os mais variados (verbais, não-verbais, orais e outros); . Observação e análise dos dados/construções de sentido dos cerca de 200 alunos envolvidos frente aos textos de humor; . Confrontação dos alunos frente às suas próprias construções de sentido; . Reconhecimento do uso das figuras de linguagem para a obtenção de finalidades sociais e discursivas; . Discussão acerca da utilização das palavras para (re)configuração de atitudes e posicionamentos sociais; . Elaboração de slogans cuja temática é o respeito aos direitos humanos. |
RESULTADOS E DISCUSSÃO: |
A dinâmica da sociedade brasileira, ao contrário do que propaga a ideologia da pós-modernidade, segundo a qual não há mais espaço para as dicotomias positivistas, mostra-nos um jogo ideológico persistente e recrudescente. Daí, vemos antigas “verdades” sendo elementos para hodiernos preconceitos quanto à orientação sexual, posicionamentos religiosos, ações de gênero e outros. Tais “verdades” muito presentes estão nos gêneros humorísticos, os quais para provocar o riso, não se sujeitam a um crivo do respeito às verdades das minorias. Os alunos que foram elementos participantes da pesquisa, que estão em processo de formação ideológica, apresentaram-se preconceituosos, haja vista que cerca de 98% deles mostraram-se bastante naturalizados com a dimensão ideológica dos textos humorísticos (altamente preconceituosos) com os quais eles se envolveram durante o desenvolvimento da pesquisa. Assim, o trabalho de “desnaturalização” foi bastante consistente, uma vez que eles usam a lógica do preconceito para justificá-lo, isto é, “É errado porque é errado”, “É certo porque é certo”. Ou seja, criticidade zero para uma construção de sentido 100% ideologicamente questionável. É evidente que o contraditório ideológico pode existir numa sociedade, mas que ele exista sobre a base dos direitos humanos. |
CONCLUSÕES: |
Embora a experiência pedagógica ora apresentada tenha sido realizada numa escola municipal de Recife, os dados obtidos e as análises estabelecidas muito dizem sobre a realidade brasileira como um todo, posto que os textos de humorísticos utilizados foram de programas televisivos nacionais, bem como as piadas foram oriundas da Internet. Esses dois veículos midiáticos muito constroem o ideológico de nossa sociedade. E a realidade apresentada é alarmante. Pois, a construção de sentido, numa perspectiva sociointeracionista, é algo que envolve o produtor do texto e seu leitor/ouvinte, ou seja, é necessário que haja um compartilhamento de ideológico para que o texto obtenha sua finalidade social (cf. Koch, em Desvendando o texto). Se os textos de humor de alto grau de preconceito tem obtido seu objetivo social, que é fazer rir, então nossos alunos, como reflexo do todo social, tem exercitado, sobre o pretexto do divertimento, atitudes de depreciação social. A escola precisa fazer valer, nas aulas de português, sua função de formadora ideológica, e não apenas linguística. Afinal, uma sem a outra é a mera prática de uma incógnita social e histórica. Então que os textos de humor estejam na sala de aula para que, a partir de uma forte reflexão, novas leituras sociais possam se fazer. |
Palavras-chave: Ensino-aprendizagem, Humor, Ideologia. |