64ª Reunião Anual da SBPC |
H. Artes, Letras e Lingüística - 2. Letras - 1. Língua Portuguesa |
O REPENTE NA LITERATURA POPULAR ORAL E ESCRITA: PROCEDIMENTOS DE DISCURSIVIZAÇÃO |
Thiago da Silva Almeida 1 Maria de Fátima Barbosa de Mesquita Batista 2 |
1. Graduando/ Autor - Depto de Letras Clássicas e Vernáculas 2. Profa. Dra./ Orientadora - Depto de Letras Clássicas e Vernáculas |
INTRODUÇÃO: |
O presente trabalho buscou analisar a cantoria de viola de autoria negra, ou que aborde sua figura, com o objetivo de identificar o processo ideológico instaurado nos textos e que possa caracterizar a imagem que o homem branco faz da figura do negro, procurando abordar o sistema de valores sustentados pelos sujeitos da enunciação. A teoria escolhida foi a semiótica de linha francesa, proposta por Greimas e seus seguidores. A cantoria de repente ou desafio é um gênero da literatura popular que apresenta como característica geral, o improviso – um diálogo cantado entre duas pessoas que são identificadas como repentistas ou violeiros. Trata-se de uma entre as várias manifestações da poesia oral, tipicamente nordestina, que teve suas origens na cultura árabe e foi transportada para o Brasil através do povo lusitano. Após a apresentação oral, o cantador ou alguns dos presentes, geralmente, escreviam em cordel a cantoria feita. O fato é que existe cantoria escrita e oral. O corpus constou de cantorias orais (desafio) e escritas (folheto) de que retiramos uma amostragem para análise, constantes no acervo do Programa de Pesquisa em literatura popular da UFPB. |
METODOLOGIA: |
Foram feitas leituras teóricas sobre a semiótica greimasiana, especificamente aspectos da sintaxe e da semântica discursiva e, em seguida, foi realizada a aplicação do conhecimento estudado à análise de um corpus. Este constou do folheto de cordel 2º Debate de Zé Pretinho com o Cego Aderaldo, de José Costa Leite e de uma cantoria oral Só com outro zumbi ou quilombola pode o negro alcançar a liberdade, recitada pelos poetas repentistas Sebastião Dias e Ivanildo Vilanova. Ambas as modalidades foram comparadas do ponto de vista discursivo para, a partir daí, identificar o sistema de valores presentes nos textos. |
RESULTADOS: |
A análise nos indicou que o texto escrito possui uma estrutura enunciativa formada em terceira pessoa, na qual as falas dos atores manifestam-se em discurso indireto livre. Aqui verificamos a presença de um eu que fala a um tu pressupostos que são o enunciador e o enunciatário. O eu pressuposto é um narrador que nos apresenta os atores e está debreado da enunciação e do enunciado no tempo e no espaço, configurando o que Batista (1999) chamou enunciador-narrador. Trata-se de um eu projetado para fora da enunciação e do enunciado, confundindo-se com o escritor que se comunica com um tu, identificado como o próprio leitor. Por sua vez, a cantoria oral manifesta-se em primeira pessoa estando os sujeitos enunciador/enunciatário embreados com a enunciação e o enunciado, confundindo-se com os atores do texto, fenômeno que foi nomeado por Batista (1999) por enunciador/enunciatário ator. O que pode haver nesse tipo de cantoria, também, é a presença de um destinatário que fornece um mote que servirá de base para o desenvolvimento da cantoria. Tais expressões são características da cultura nordestina que se fazem presentes no fazer do povo, nem sempre escolarizado, mas capaz de refletir os anseios da sociedade em que vive. |
CONCLUSÃO: |
As pesquisas indicaram que a figura do negro é diminuída em ambas as manifestações – oral e escrita. Porém, evidencia-se que o negro é tão competente quanto o seu oponente quando se trata de desafio. O branco sustenta-se na trajetória histórica e se põe como senhor do seu oponente que estava na posição de escravo. Portanto, o que se verifica é um duelo voltado também para as raízes históricas, quando a relação do senhor era maltratar seu escravo. Este último, apesar de submisso, possuía habilidades que aquele não possuía, acentuando-se as diferenças apenas quanto à classe social. Observou-se, ainda, que tanto o texto oral quanto o texto escrito possuem as mesmas manifestações ideológicas. Contudo, tais manifestações são expressas em tempos cronológicos distintos. Enquanto na manifestação escrita a rima e o improviso são elaboradas por um narrador e em períodos distintos, na manifestação oral, dá-se na base do aqui e agora. |
Palavras-chave: Cantoria, Semiótica, Enunciação. |