64ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 3. Antropologia das Populações Afro-Brasileiras
Etnografia histórica de práticas culturais em Monte Alegre: identidades, mudanças e tensões
Fladney Francisco da Silva Freire UFMA
Antonio Evaldo Almeida Barros UFMA
1. Graduando Curso de Ciências Humanas – UFMA
2. Profª. Me./Orientador – Curso de Ciências Humanas – UFMA
INTRODUÇÃO:
Monte Alegre é uma comunidade remanescente de quilombo, reconhecida através de certificado expedido pela Fundação Cultural Palmares, e já passou por intensos conflitos de terra no final da década de 1970 e início dos anos 1980. Esses conflitos ocasionaram vários problemas para os moradores locais, que tiveram suas casas queimadas por um fazendeiro que almejava a desapropriação da terra pelos trabalhadores a fim de transformá-la em área privada para o desenvolvimento da pecuária. Para impedir tal ato os moradores da comunidade se uniram coletivamente, criando estratégias de resistência e evitando serem expropriados dessa terra. Algumas práticas culturais da comunidade são consideradas tradicionais por seus moradores mais antigos, como o tambor de crioula, a mangaba, a festa do divino, as quadrilhas e o boi, no período de festa junina. No campo religioso são comuns terecô, catolicismo popular e cultos evangélicos. Entretanto, na comunidade, há um olhar enviesado em relação às praticas de Umbanda, pois o discurso dos moradores que frequentam outros segmentos religiosos é pejorativo e de reprovação em relação a essa prática. Nesse sentido, muitos conflitos circundam vários âmbitos da comunidade tendo reflexos significativos no exercício das práticas culturais e religiosas.
METODOLOGIA:
A metodologia adotada para a realização desta pesquisa foi baseada na perspectiva da historia social e da etnografia, com as ferramentas da história oral, que possibilitou a coleta de informações gerais sobre as práticas culturais e religiosas em Monte Alegre. Sabe-se que a história oral é extremamente útil para preencher as lacunas da história, para compensar a falta de documentação. Foram feitas 20 entrevistas semiestruturadas com moradores de ambos os sexos, com faixa etária, classificação racial e ocupação cultural e social diferenciadas. Fez-se uso de gravadores, câmera digital e outros equipamentos para otimizar o trabalho de campo. O trabalho etnográfico, realizado em 2011 e início de 2012 teve por finalidade entender a dinâmica cultural e religiosa do local com base nas questões previamente elaboradas na pesquisa.
RESULTADOS:
Há igrejas católica e evangélica, bem como terreiros de terecô na comunidade, e não é incomum que um mesmo sujeito, embora se identificando como católico ou evangélico, frequente todos esses espaços religiosos. Os tambores utilizados no tambor de crioula são guardados na igreja católica e têm status de sagrado. É comum haver mobilizações coletivas, como quando da realização de mutirões para construção de casas e batizados, quando a maioria dos moradores se envolve nos preparativos e realização das atividades que circundam esses eventos. Há terreiros ativos na comunidade e, sobretudo, muitos extintos ou mesmo sem funcionamento, o que se relacionaria ao fato de que os antigos pais de santo não têm tido seus trabalhos nos terreiros continuados pelos seus familiares ou adeptos. Pais que se identificam com o terecô têm filhos jovens que se identificam com o reggae, as serestas (festas dançantes) e o futebol. Os moradores referem-se ao desaparecimento de diversas organizações festivas, como a mangaba, o boi, a quadrilha e temem que o mesmo suceda com o terecô. De outro lado, para agentes externos ou que frequentam a comunidade esporadicamente, como padres, Monte Alegre seria uma terra onde o cristianismo não se desenvolveria devido a presença das práticas culturais afro-brasileiras.
CONCLUSÃO:
Em Monte Alegre, comunidade predominante negra, um elemento diacrítico importante é ser católico, evangélico ou frequentar o terecô. Atualmente, a comunidade encontra-se num processo forte de tentativa de reorganizar algumas das festas que lhes caracterizam, como a festa de São Benedito, quando se realizam missas, tambores e festas. Há uma clara mudança geracional que impacta diretamente nas formas de relações sociais que atualmente se estabelecem na comunidade. As culturas juvenis têm mantido certa distância de práticas anteriormente consideradas tradicionais na comunidade, particularmente aquelas identificadas com tradições afro-brasileiras, como o terecô que, de algum modo, parece não representar a modernidade com a qual buscam se identificar os mais jovens. Os mais velhos têm buscado, de diferentes modos, renovar as práticas culturais mais antigas, particularmente os terreiros de terecô. O fato é que as relações que se estabelecem no campo religioso em Monte Alegre constituem um campo privilegiado para se analisar as concepções e dinâmicas sociais mais amplas dessa localidade.
Palavras-chave: Conflitos, Monte Alegre, Práticas Culturais e Religiosas.