64ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 7. Educação - 11. Ensino-Aprendizagem
A INTERAÇÃO PROFESSOR–ALUNO NO PROCESSO DE PRODUÇÃO DE TEXTOS: O BILHETE COMO UM INSTRUMENTO MEDIADOR
Moyra Ribeiro Marques 1
Aida do Amaral Antunes 1
Raisa Silva Matos 1
Suzana Lima Vargas 2
1. Depto. de Educação, Faculdade de Educação, Universidade Federal de Juiz de Fora
2. Profa. Dra./ Orientadora - Depto de Educação – UFJF
INTRODUÇÃO:
Este trabalho, vinculado à pesquisa “Processos de escrita, revisão e reescrita de textos” (FAPEMIG), a partir da noção de língua como atividade social, histórica e cognitiva defendida por Bakhtin (2003), discute o papel do bilhete produzido pelo professor como instrumento mediador na interlocução estabelecida com os alunos, em torno de seu processo de escrever, revisar e reescrever textos. Na concepção bakhtiniana, o homem é tido como um ser social e só pode ser conhecido através de seus textos, de modo que os indivíduos, quando se comunicam, não trocam orações nem palavras, mas enunciados que se constituem com os recursos formais da língua. Ao analisar os papéis dos sujeitos no diálogo que se dá no uso da língua, Bakhtin destaca a alternância de sujeitos falantes como a primeira particularidade constitutiva de enunciados. Quanto a isso, destaca que o ouvinte torna-se locutor, dado que a compreensão do enunciado é acompanhada de uma atitude responsiva ativa e toda a compreensão é prenhe de resposta. O bilhete do professor é compreendido como um enunciado pleno, pois propõe percursos por meio de asserções, ordens e perguntas e evidencia como o professor cria espaços para a troca de turnos na interlocução aluno-produtor/professor-corretor/aluno-revisor.
METODOLOGIA:
O corpus que possibilitou a análise é um recorte transversal do banco de dados da pesquisa longitudinal “Processos de escrita, revisão e reescrita de textos por alunos do ensino fundamental”, desenvolvida no Laboratório de Alfabetização da FACED/UFJF. O banco de dados é constituído de 1460 produções textuais elaboradas por alunos do 3º ao 5º ano e 64 bilhetes produzidos por um grupo de 04 professores-bolsistas dos cursos de Letras e Pedagogia que atuavam junto aos alunos em atendimentos pedagógicos semanais. Para o presente estudo, foram selecionados 24 bilhetes produzidos do início do ano de 2011, em uma situação didática de produção de narrativas escritas, na qual os professores visavam assegurar a interlocução professor-aluno nos momentos de correção e revisão textual. Trata-se de uma análise qualitativa, voltada para produzir interpretações dos dados produzidos no contexto dos atendimentos pedagógicos, atenta às transformações que a dinâmica interacional produz nos sujeitos envolvidos e aos modos como os sujeitos organizam, interpretam e dão forma às suas experiências de produção, correção e revisão de textos.
RESULTADOS:
A análise dos bilhetes mostrou o predomínio de ordem (78 ocorrências) para abordar os aspectos relacionados à forma (ortografia, pontuação, paragrafação). As perguntas esclarecem questões implícitas e pressuposições (20 ocorrências) ou apontam um encaminhamento para os ajustes de sentido (16 ocorrências). As asserções ora referem-se aos elogios daquilo que o aluno soube fazer (34 ocorrências) e, ora cobram o que estava insuficiente (40 ocorrências).
A correção textual-interativa revelou a maneira como o professor dialogava acerca de questões linguístico-discursiva, por meio de perguntas, ordens e asserções positivas ou negativas. Dos 24 bilhetes analisados, 7 bilhetes mais se assemelham a cartas em função de sua ampla exploração: (i) apontam correções de questões gramaticais; (ii) elogiam as escolhas discursivas; (iii) destacam o empenho do aluno no trabalho de produção do texto; (iv) fornecem propostas claras à tarefa de revisão; (v) indiciam a construção de uma certa afetividade entre os envolvidos na interlocução. Esses encaminhamentos revelam a perspectiva dialógica do discurso de correção e indicam a necessidade do professor de ir além das formas mais tradicionais de correção que apenas tratam dos problemas da superfície textual.
CONCLUSÃO:
Conclui-se que a correção mediada por bilhete é um método eficaz tanto na formação inicial dos professores de português quanto na constituição das crianças enquanto escritoras. De um lado, o professor revelou indícios da apropriação de um novo gênero que fortaleceu as relações dialógicas com os alunos em torno de suas produções escritas e ampliou suas possibilidades de promover reflexões acerca dos aspectos discursivos, não se restringindo às correções gramaticais. Além disso, os bilhetes também revelaram o grau de maturidade linguística dos professores, pois sua escrita envolveu o domínio da língua e da metalinguagem, conhecimento que lhes permitiu falar dos problemas textuais e conduzir a intermediação necessária na direção da relação forma-conteúdo. O modo de correção textual-interativo permitiu que os problemas encontrados no texto fossem apresentados como uma forma de interagir com o modo de dizer e com o dizer do aluno, analisando o texto como um todo coerente. Em outras palavras, o que cada bilhete dos professores desejava dizer aos alunos era constituírem como autores, tornando-se responsáveis pelo que escreviam, a partir de uma posição conscientemente assumida em suas narrativas, ampliando suas próprias possibilidades de construção da significação.
Palavras-chave: Interação, Bilhete, Produção textual.