63ª Reunião Anual da SBPC
H. Artes, Letras e Lingüística - 3. Literatura - 2. Literatura Comparada
A OBRA DE HERMAN MELVILLE: COERÊNCIA SUI GENERIS
Lucas Pereira Novaes 1
Pedro Dolabela Chagas 2
1. Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários - Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (UESB)
2. Prof. Dr./Orientador – Departamento de Estudos Lingüísticos e Literários - UESB.
INTRODUÇÃO:
O escritor norte-americano Herman Melville se diferencia de outros escritores oitocentistas no que diz respeito à construção da narrativa e dos seus personagens. Quando cotejada com obras canônicas do século XIX, a obra de Melville, se distancia da tradição romanesca de sua época, uma vez que, aos olhos do leitor e do crítico do período, ela fugiria ao padrão realista de obras como As ilusões perdidas, de Balzac, e Middlemarch, de George Eliot. Tal diferença faz pensar, à primeira vista, que haja certa irracionalidade ou incoerência nos livros do romancista. A leitura e a comparação com outros escritores permitem, então, a averiguação dessa distância da tradição literária e a análise da aparente “incoerência” encontrada na narrativa melvilliana.
METODOLOGIA:
A análise de obras de Melville (como Billy Budd e Bartleby), junto com obras canônicas do século XIX (As ilusões perdidas e Middlemarch), permite traçar diferenças a partir da leitura comparativa. Para entender como Melville constrói personagens aparentemente “inexplicáveis”, porém coerentes quando inseridas no contexto ficcional, procuraremos apreender como Melville manipula as expectativas do leitor quanto aos modos-padrão de organização e conduta social, para delas se distanciar conscientemente. A obra teórica de Wolfgang Iser (O ato da leitura), a sociologia fenomenológica de Berger e Luckmann (A construção social da realidade), além da análise nietzschiana do comportamento institucional (em Genealogia da moral) serão úteis tanto para a compreensão dos personagens melvillianos, quanto para o entendimento de certa organização social própria à narrativa de Melville.
RESULTADOS:
A obra de Herman Melville – aparentemente “inexplicável” por conta de personagens que nela aparecem e situada à margem da tradição realista da literatura – tem, em seu interior, forma própria e possui uma coerência que lhe é, também, peculiar. Personagens melvillianos como Bartleby, por exemplo, obedecem à lógica interna e própria da narrativa – apesar dessa lógica diferenciar-se ou mesmo destoar radicalmente da organização social tal como a conhecemos. Há, assim, uma cisão entre o que o leitor de um romance canônico do século XIX espera encontrar em uma obra ficcional e o que ele, de fato, encontra em Melville, provocando algumas caracterizações advindas dessa distância – como quando se denomina o autor e suas obras de “anormais” ou “estranhas”. A obra melvilliana, no entanto, não é “incoerente”, mas obedece a uma organização representada pela tipologia que Deleuze criou para dividir e qualificar seus personagens; logo, existem em Melville três tipos básicos de personagens: os monomaníacos ou demônios (movidos por uma “vontade de nada”), os anjos ou hipocondríacos (criaturas de inocência e pureza) e os profetas (ou mestres da razão), que organizam os “pedaços da razão” necessários para a futura compreensão do que não é “explicável” por outra lógica que não a da própria obra.
CONCLUSÃO:
A leitura comparativa com Balzac e Eliot permite estabelecer diferenças entre o romance realista oitocentista e um autor específico (o norte-americano Herman Melville). Em obras como Billy Budd e Bartleby, Melville rompe com a tradição literária de sua época ao construir uma coerência e uma lógica que são próprias a seus escritos e inexplicáveis ou “irracionais” quando lidas em comparação com o padrão, com o cânone, representados, em nosso trabalho, por As ilusões perdidas e Middlemarch. Ao construir essa coerência, suspende-se, também, por parte do leitor, a exigência por significados pré-estabelecidos por outras leituras, ou por outra “lógica” socialmente concebida e aceita.
Palavras-chave: Literatura norte-americana, Melville, Literatura oitocentista.