63ª Reunião Anual da SBPC
H. Artes, Letras e Lingüística - 1. Artes - 7. Música e Dança
A CRISE DO CONCEITO DE IDENTIDADE CULTURAL NO SOLISTA DE DANÇA CONTEMPORÂNEA: A CRIAÇÃO DE LETÍCIA SEKITO.
Flávia Couto do Nascimento 1
Helena Tania Katz 2
1. Fac. de Filosofia, Comunicação, Letras e Artes – PUC/SP
2. Profa.Dra. / Orientadora – Depto. de Linguagens do Corpo – PUC/SP
INTRODUÇÃO:
Nas décadas finais do século XX devido aos fluxos de interconexão entre países, economias e povos diferentes – fenômeno produzido pela globalização neoliberal – os processos de mestiçagem e hibridação começaram a ser intensamente discutidos no campo da pesquisa científica.
No ambiente da dança não foi diferente, a urgência em trazer à cena questões sobre o corpo mestiço e híbrido tornaram-se frequentes e foram reflexo da crise que tocou o cerne do que se entendia como identidade, um conjunto de características lineares providas de um núcleo que pouco sofria mutações, a implosão desse conceito gerou nos dias atuais a necessidade de um novo olhar em direção ao sujeito, um olhar que reconheça as singularidades de um corpo específico antes de mistificá-lo e etiquetá-lo.
Nossa proposta foi através da análise do trabalho coreográfico de Letícia Sekito, artista que na cena paulistana traz como inquietações falas sobre singularidades do corpo mestiço e hibridismo cultural, junto a bibliografia de autores pós-colonialistas que evidenciam os mecanismos e efeitos pós-coloniais sobre diversas culturas, investirgarmos os meios pelos quais o artista de dança contemporânea pode discutir politicamente em metafóras e escolhas estéticas questões pertinentes ao meio comum.
METODOLOGIA:
Estudo bibliográfico e análise dos DVDs que apresentam os três trabalhos cênicos de Letícia Sekito, sendo eles: “Disseram que eu era japonesa” (2004), “E eu disse:” (2007) e “O Japão está aqui?” (2008).
Participação dos encontros do Centro de Estudos em Dança (CED) coordenado por Helena Katz e sediado na PUC-SP.
Acompanhamento dos trabalhos apresentados por Letícia Sekito e sua Cia. Flutuante na cena paulista : Corpo e Plástico #9 (2010); “Experimento Portátil – uma ação sob encomenda” (2008) assistido em vídeo, trabalho que trata dos clichês que envolvem o corpo feminino.
Acompanhamento de alguns trabalhos coreográficos da cena paulista de dança contemporânea, especialmente solos.
Participações como público no Teorema, projeto que acontece no Estúdio NAVE em que se reúnem artistas e teóricos da dança para um exercício de integração dos diferentes modos de pensar a dança contemporânea e buscar a flexibilização da relação artista/público.Assim como no Primeiro Passo, projeto de dança que objetiva apresentar novos criadores ou criadores que iniciaram um novo percurso, acontece no SESC Pompéia com assessoria de Helena Katz. Nesse caso há a proposta de um diálogo aberto, sobre pesquisa artística e teórica, entre o público, o pesquisador convidado e os artistas.
RESULTADOS:
No campo da pesquisa científica, autores pós-colonialistas criaram estudos refinados, que estimulam reflexões sobre as problemáticas que os processos de mestiçagem e hibridismo apresentam.A tradicional pesquisa empiríca, que produz concepções fixas sobre seus objetos ou campos de estudos, foi problematizada devido à incapacidade de suas ferramentas analisarem fenômenos rizomáticos dotados de fluxos multivetoriais.Os fenômenos da mestiçagem e hibridismo são altamente complexos, pois não apresentam respostas assertivas com facilidade e possivelmente estão nas entranhas evolutivas da espécie humana.
É necessário conceitualizar a identidade como um coletivo de hábitos e referências de múltiplos territórios que perpassam o ser humano no decorrer de sua vida, possuem uma dinâmica oscilante e se transformam incessantemente, delineando, assim, a identidade como um quadro fragmentado e transitório.
No percurso da artista Letícia Sekito a relevância de sua trilogia sobre singularidades é clara e concisa, seus trabalhos apontam para possibilidades emergentes nas discussões sobre mestiçagem, hibridação e identidade.Eles não se apresentam como espetáculos-denúncia de uma realidade crítica, mas sim, tratam de modo reflexivo, não ingênuo, inquietações e conflitos de alta grandeza na atualidade.
CONCLUSÃO:
A pesquisa de dança, aqui abordada, é exemplo do esforço de outros artistas, que assim como Sekito, estão no campo da arte para discutir o contemporâneo e tudo que o compete. Pensando a política como uma forma de experiência pessoal e coletiva, o exercício de expor e dividir reflexões aos modos de feitura específicos da dança, é também um ato político, com potencialidade modificadora dos bens comuns.
A vida acontece no ambiente político e não se desvincula dele, o que falamos expressa nossas formas de ver o mundo, um mundo compartilhado, onde a arte como forma manifesta do ponto de vista de quem à fala se mostra catalisadora das questões da contemporaneidade.
O corpo que dança está conectado com seu ambiente em um movimento de colaboração mútua onde ambos são contaminados por toda a rede de informação que os permeia.
É na escolha estética específica do artista que seu vínculo com o ambiente se demonstra, nesse âmbito que o corpo, voluntariamente ou involuntariamente, indica direções co-evolutivas que dizem respeito ao meio social, tecnológico, biológico, enfim, à cultura.
Palavras-chave: Mestiçagem, Hidridismo cultural, Corpo que dança.