63ª Reunião Anual da SBPC
C. Ciências Biológicas - 5. Ecologia - 4. Ecologia
Aves brasileiras ameaçadas de extinção: quanta diversidade funcional estamos perdendo?
José Hidasi Neto 1
Marcus Vinicius Cianciaruso 2
1. Departamento de Ecologia - UFG
2. Prof. Dr./ Orientador - Departamento de Ecologia - UFG
INTRODUÇÃO:
A avifauna brasileira é uma das mais diversas do planeta. De cerca das 10.000 espécies de aves já descritas, estima-se que aproximadamente 1825 espécies ocorram no país. O bioma com maior diversidade de aves é a Amazônia, sendo seguido pela Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Campos Sulinos e Pantanal, respectivamente. Ainda, aproximadamente 130 espécies vivem nos ambientes costeiros e marinhos do país e 89 são aves migrantes, oriundas de outras regiões, e que normalmente passam um curto período no país, onde se alimentam e reproduzem. A International Union for Conservation of Nature (IUCN) e várias listas nacionais dividem as espécies em seis categorias de ameaça: menor preocupação, vulnerável, em perigo, criticamente em perigo, extinta na natureza e extinta. A diversidade funcional mede a complementariedade entre espécies, ou seja, a propriedade de pelo menos o valor de um traço de uma espécie diferir de um traço de outra espécie. Assim podemos estimar a perda de diversidade funcional simulando a extinção de determinados grupos de espécies. Nesse trabalho respondemos as seguintes perguntas: A extinção simulada de aves que estão em categorias mais críticas nas listas nacionais de conservação leva a maiores perdas funcionais do que a extinção aleatória do mesmo número de espécies? Ocorre o mesmo com aves das demais categorias? Sendo assim, em termos funcionais, faz diferença conservar espécies que estão em categorias mais ou menos críticas?
METODOLOGIA:
Calculamos os valores de diversidade funcional utilizando o índice FD. Este resume-se em quatro etapas principais: i) obter uma matriz de características, ii) converter a matriz de características em uma matriz de distância, iii) realizar o agrupamento da matriz de distância para produzir um dendrograma, e iv) calcular o comprimento total das ramificações do dendrograma que ligam todas as espécies em determinada comunidade. Usamos o método de agrupamento pela média e a distância de Gower, sendo que nossos valores foram padronizados em uma faixa de 0 a 1. O cálculo e as seguintes aleatorizações foram feitas no ambiente computacional R. Testamos se os valores observados de diversidade funcional encontrados para as diferentes categorias de ameaça eram diferentes do esperado ao acaso. Para isso, fixamos a riqueza de espécies dessas categorias e aleatorizamos as aves que ocorreriam nelas para que fossem gerados novos valores esperados ao acaso de diversidade funcional. Obtivemos 5.000 valores simulados com a repetição desse procedimento. Valores observados de diversidade funcional maiores que o esperado ao acaso indicam que as aves são consideravelmente, em termos de traços funcionais, diferentes entre si, valores menores mostram que as aves são bastante redundantes ou similares e valores iguais ao esperado ao acaso indicam que não são mais similares ou diferentes entre si do que se esperaria ao acaso.
RESULTADOS:
Comparamos os valores observados de diversidade funcional das categorias de ameaça com os valores esperados ao acaso encontrados através das aleatorizações. Observamos que todos os valores situaram-se entre os intervalos de confiança dos valores simulados. Isso indica que a diversidade funcional das aves em todas as categorias de ameaça não diferiu do que se esperaria ao acaso. Portanto, a eventual extinção de todas as espécies de aves de qualquer categoria de ameaça deve levar, em âmbito nacional, a uma perda de diversidade funcional similar àquela causada pela extinção aleatória do mesmo número de aves da categoria. Uma possível explicação para o resultado é a escala que utilizamos. Por exemplo, relações entre espécies dentro de cada bioma brasileiro são desconsideradas, pois testamos a complementariedade entre as aves de todo o território nacional. Podemos ter biomas com aves muito diferentes entre si, enquanto outros podem apresentar aves bastante redundantes. Quando testamos a diversidade funcional entre as aves de todo o país, perdemos essas relações. Caso os resultados obtidos em áreas menores fossem diferentes do que encontramos para todo o território nacional, ficaria mais clara a adoção de listas e políticas de conservação da biodiversidade em escalas locais. Entretanto, pelo resultado que encontramos, a necessidade de se preservar as aves da categoria “extinta na natureza” seria a mesma que a da categoria “Menor preocupação” ou qualquer outra categoria de ameaça.
CONCLUSÃO:
Procuramos demonstrar os padrões de diversidade funcional encontrados nas aves brasileiras ameaçadas de extinção para que fossem estimadas as possíveis perdas funcionais com a eventual extinção de espécies das categorias de ameaça do Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção. Esperávamos encontrar valores de FD diferentes do esperado ao acaso, já que normalmente as extinções não ocorrem de forma aleatória. Entretanto, os valores de FD foram todos iguais ao esperado ao acaso para todas as categorias de ameaça. As escalas utilizadas para a análise dos dados podem influenciar os resultados obtidos de diversidade funcional. Por exemplo, um bioma pode ter aves bastante complementares, enquanto outro possui espécies bastante redundantes. Quando consideramos espécies ameaçadas em todo o Brasil, perdemos as relações entre as aves de regiões menores no país. Nossos resultados indicam que, em termos funcionais, não existem categorias mais ou menos preocupantes, ou seja, que necessitariam de mais investimentos em sua proteção. Podemos então questionar sobre como as listas nacionais de conservação são desenvolvidas, ou mesmo sobre a necessidade de listas mais locais, como dos estados e biomas brasileiros, para que sejam aplicadas diferentes ações para a conservação da natureza. Estudos sobre o funcionamento e extinção de assembleias, além de ajudarem no teste de teorias ecológicas, nos permitem entender e a prevenir contra as possíveis perdas da biodiversidade.
Palavras-chave: categorias de ameaça, conservação, avifauna.