62ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 3. Filosofia - 2. Filosofia
A INTRODUÇÃO DA SENSIBILIDADE NO ESTUDO DO DIREITO
Talitha Selvati Nobre Mendonça 1
1. Faculdade de Direito, Universidade de Brasilia/UnB
INTRODUÇÃO:

A presente investigação consiste em uma análise do Direito e da linguagem a partir da inserção de elementos dionisíacos, que dizem respeito à criatividade, à sensibilidade e à clareza, em contraposição a elementos apolíneos da razão e sistematização jurídica. O Direito por muito tempo representou fictamente a construção da homogeneidade e da igualdade, e hoje busca a destruição dessa igualdade aparente e a retomada da heterogeneidade, da pluralidade e da compreensão da diferença dentro da igualdade. Foi sob essa perspectiva, a de um novo paradigma do Direito que busca o fortalecimento da (inter)subjetividade e da alteridade por meio da compreensão das ficções jurídicas, que se teceu as conexões entre o direito e a linguagem e suas múltiplas possibilidades de interpretação e criação, que podem extrapolar a tradição jurídica e judicial a fim de proporcionar uma conformação sensível da norma ao caso concreto.

METODOLOGIA:

Contudo, como confrontar a tradição do próprio Direito com a possibilidade de transpor seus limites hermenêuticos? É em torno dessa problemática, a partir de uma breve análise e observação sobre o acesso e a satisfação da resolução dos conflitos oferecida pelo sistema judicial, que se desenvolveu a presente investigação. Trata-se de uma perspectiva que intenta retomar o lugar do sujeito perante a aplicação de uma norma, reconsiderando a intersubjetividade e ponderando elementos dionisíacos na interpretação e aplicação do Direito a um caso concreto. Para tanto, realizou-se a análise de importantes obras sobre a necessidade de uma interpretação sensível e sua consequente importância para uma mudança na práxis jurídica, entrevista semi-estruturada com sua transcrição e análise do seu conteúdo e observação de um ambiente de atendimento a vítimas. Cabe aqui ressaltar que essas estratégias de recolhimento e análise de dados foram desenvolvidas pensando no papel do investigador em uma pesquisa qualitativa e na sua interação com o objeto de estudo ao longo da realização do mesmo, como parte explícita e integrante da produção de conhecimento.

RESULTADOS:

A metodologia escolhida permitiu a construção do objeto em estudo de maneira satisfatória, de modo a demonstrar as ambivalências da construção homogênea do Direito, indicando os reflexos da sua não-interpretação e não-aplicação sensível na resolução dos conflitos. O que aqui se tenta propor não é a exclusão da razão do pensamento jurídico-filosófico para a interpretação da lei e sua aplicação ao caso concreto, mas sim, a prática de uma razão sensível, que reconheça o projeto de construção homogêneo de uma 'ciência social' que lida essencialmente com o heterogêneo. Há que se considerar que o Direito fica nesse limite ao mesmo tempo em que, igualmente, surgem possibilidades de criar, de pensar e de construir algo além dele próprio. Nessa perspectiva, questionou-se sobre o projeto de homogeneização da pluralidade, o que encobriu a tensão entre os planos da facticidade e da validade, excluindo o diverso e criando uma performance de emancipação, mas com a exclusão da intersubjetividade e do dionisíaco da interpretação e aplicação do Direito o que, consequentemente, possibilitou repensar o papel do sujeito em sua interpretação e aplicação e a performance jurídica por trás da justificação da argumentação e aplicação da lei.

 

CONCLUSÃO:

A alteridade por meio da inserção da sensibilidade na práxis e no estudo do Direito torna-se questão central para uma reflexão sobre a justificação da validade normativa e o rompimento com a ficção do pressuposto emancipatório que permeia a modernidade. O Direito tem a função de solucionar conflitos de modo a sempre refletir as demandas da sociedade considerando as necessidades e peculiaridades de cada caso e de cada indivíduo, vez que esses são os destinatários das normas, e sua historicidade revela um esmagamento da alteridade e uma tradição apolínea da compreensão e aplicação dessas normas. O esforço é retomar os elementos dionisíacos e diversificar o sistema para saídas hermenêuticas e práticas que possibilitem a inserção de elementos sensíveis para a compreensão e resolução dos conflitos e, consequentemente, o reconhecimento de que os destinatários desse Direito são pessoas com histórias de vida particulares e contextos sociais igualmente distintos. Dessa maneira, o Direito não deve ser aplicado de modo tão distante da realidade a que serve, pelo que urge a introdução da sensibilidade no estudo e na práxis do Direito.

Instituição de Fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq
Palavras-chave: hermenêutica, sensibilidade, práxis jurídica.