61ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 1. Antropologia da Religião
FESTA DE SANTO E O APRENDIZADO DA REZA
Beleni S. Grando 1
Neide S.Campos 2
Maria Rita S. Pereira 1
Eva Batista S. Silva 1
1. Universidade do Estado de Mato Grosso
2. Universidade Federal de MAto Grosso
INTRODUÇÃO:

A presente pesquisa integra ao projeto de pesquisa e extensão Corpo e Educação: festas e jogos como forma de mediações interculturais em relações de fronteiras étnicas e culturais em Mato Grosso, institucionalizado no Núcleo de Estudos Corpo, Educação e Cultura, COEDUC/UNEMAT. O objetivo de pesquisar as/os rezadoras/es, parte da necessidade de fazer um mapeamento sobre quem são estas autoridades que compõem as festas religiosas locais, como aprenderam a tirar a reza, e como estes saberes populares são transmitidos às novas gerações. Na festa a reza inicia-se após o levantamento de mastro, orientado pelos cururureiros, após este momento quem conduz o ritual são as rezadeiras ou o capelão. A reza inicia-se com a ladainha respondida por todos os presentes em latim popular, sendo seguida da “salve rainha”, “reza do santo”, “glória da Virgem”, sendo finalizada com o “chamado a irmandade” para beijar o santo. Todas as rezadeiras e capelão trazem consigo, como foi observado, um “caderno de reza”, contendo os mais variados tipos de reza, tornado-se um material sagrado, num contexto em que a escrita é domínio de poucos. Observou-se que a maioria dos cadernos traz marcas do tempo inscrito em cada página, o seu tom amarelado, os pingos de velas, algumas folhas queimadas, demonstrando a história da própria rezadora/or. busca-se registrar-lhes a história e demarcar seus territórios identificando-os e desvelando as formas com as quais mantêm a cultura da reza viva, por considerarmos a importância destes para a cultura local.

METODOLOGIA:

Pesquisa qualitativa, de cunho etnográfico. A pesquisa qualitativa prevê o contato direto das pesquisadoras com seu campo de pesquisa, e nesse sentido, o campo de investigação empírica foram às festas de santo, para diagnosticar quem são as pessoas que detém os saberes da reza. No final de 2008 e início de 2009, foram realizadas pela equipe do COEDUC, entrevistas com estas autoridades culturais. Recorremos para registro à câmara digital, filmadora e gravador, para realizarmos as entrevistas semi-estruturadas que busca compreender quem são, por que rezam, como transmitem seus ensinamentos, e como aprenderam a rezar. Como fonte de pesquisa recorremos a cerca de 20 cadernos de reza, que foram digitalizados a fim de dar retorno aos sujeitos, atendendo a uma solicitação durante pesquisa. Pretende-se assim, ao final da pesquisa organizar um acervo como “livro de reza”, devolvendo aos sujeitos suas histórias e saberes, valorizando-os e contribuindo para a transmissão e manutenção das rezas populares nas festas de santo. Nesta pesquisa dialogamos com Pessoa (2005), Grando (2007), Mauss (1999), Steil (2001), Fleuri (1998), Geertz (2008).

RESULTADOS:

Os rezadores estão distribuídos nos diversos bairros da cidade de Cáceres, atendem sua própria comunidade, os bairros adjacentes, comunidades rurais, além de alguns viajarem para atender outras cidades do estado de Mato Grosso. Encontramos mais mulheres exercendo este ofício, ao contrário do que acontece com o cururu, cujo espaço é privilégio dos homens. No entanto, alguns homens que são cururueiros também tiram a reza. Os motivos que levaram estes sujeitos a tirar a reza, não se diferem muito, alguns se tornaram rezadores pela necessidade de autoridades locais que pudessem manter o ritual festivo. Outros para cumprir uma promessa de graça alcançada. Entre as rezadoras/res, a maioria procura transmitir esses ensinamentos as novas gerações, porém alguns se mostram descontente com o fato dos jovens não terem interesse em aprender. Nos relatos, a maioria identificou como relevante sua participação como ajudante de uma/um rezadora/or para a efetivação do aprendizado. Encontramos sempre nas rezas, a figura destes ajudantes, geralmente estas pessoas sabem todos as rezas, mas não se classificam como rezadores. Pode-se afirmar com Mauss (1999), que a diferença entre estes dois papeis está na construção da autoridade da/o rezadora/or que se estabelece nas relações sociais presentes no momento da festa. Na ausência dos rezadores, os ajudantes fazem o papel de substituto dos rezadores. Neste processo renovam e mantêm a cultura popular dando novos sentidos e significados as formas de garantir o ritual da festa de santo.

CONCLUSÃO:

A reza é um elemento fundamental na festa de santo. É através dela que o promesseiro cumpre a promessa ao santo de devoção, e quando não há possibilidade de realização da festa com todo o ritual: cururu, levantamento de mastro, dança, esta se mantém pela presença da reza tirada por uma autoridade constituída coletivamente. Nas palavras de Geertz (2008, p.4), “O homem é um animal amarrado a teias de significados que ele mesmo teceu” e continua tecendo, ao transmitir valores, normas e tradições em sua maneira de fazer e de ser, de pensar e de amar, garantindo a vida em comunidade. Como sujeito histórico, renova-se nas manifestações vivenciadas cotidianamente, garantindo saberes culturais que o identificam no seu grupo social. Para aprender a fazer e ser, recorre aos sentidos na apropriação dos saberes com os quais se identifica: olhar, ouvir, tocar, sentir, enfim, imitar, vivenciar cada ato e gesto próprio de seu grupo social. Pessoa (2005), referindo-se ao ofício presente nas festas de santo, ressalta que este é um processo de necessidade comunitária, assim como a escolha do oficio passa pelo crivo e aprovação da comunidade a qual servirá. Outro fator relevante é que essas autoridades exercem funções paralelas, pois, muitas vezes tais funções não são marcadas pelas relações econômicas, pois as atividades não são pagas. Desde modo, o ofício de rezadora/capelão é uma construção coletiva de reconhecimento da comunidade como um saber-fazer indispensável para a permanência da cultura popular cacerense.

Palavras-chave: Cultura Popular, Festa de Santo, reza .