60ª Reunião Anual da SBPC




H. Artes, Letras e Lingüística - 3. Literatura - 1. Literatura Brasileira

A PERSONAGEM DO ROMANCE BRASILEIRO CONTEMPORÂNEO - 1965/1979 E 1990/2004

Aline de Almeida Costa Ribeiro1
Regina Dalcastagnè2

1. Departamento de Lingüística, Português e Lí­nguas Clássicas - LIP/UnB
2. Departamento de Teoria Literária e Literaturas - TEL/UnB


INTRODUÇÃO:
O leitor ao interromper seus afazeres cotidianos e abrir um romance espera se deparar com um novo mundo, algo que lhe traga outras experiências de vida. O romance, enquanto gênero, possibilita tal feito ao leitor a partir do momento que se acredita ser uma arte que contempla a pluralidade (sexo, idade, cor, profissão, classe social). De acordo com Bakhtin em “Questões de literatura e de estética”, o romance não envolve apenas narrador(a) e personagens, mas sim, leitores(as) e autores(as). Dessa forma, é importante que o leitor(a) se reconheça dentro da obra. A partir de tais reflexões, iniciou-se a pesquisa “Personagens da Narrativa Brasileira Contemporânea”, que teve como objetivo traçar o perfil da personagem do romance brasileiro contemporâneo de forma a contrastar os resultados colhidos com a realidade brasileira e de seus autores. A idéia era entender a influência da perspectiva social dos escritores sobre a representação literária que efetivam. Logo no início se constatou a falta de dois grupos: negros e pobres. Dessa forma, pensou-se na idéia de invisibilidade desses grupos perante a sociedade brasileira, de forma que os autores seriam os representantes da grande massa que não os enxerga. Daí surge a importância da subjetividade do observador, sendo extremamente usual mapear, além das personagens, os autores, ou seja, as pessoas que falam pelas personagens e que lhes dão vida.

METODOLOGIA:
A pesquisa “Personagens da Narrativa Brasileira Contemporânea” desenvolvida e coordenada pela professora Regina Dalcastangnè, que leciona no Departamento de Teoria Literária e Literaturas da Universidade de Brasília e por um grande grupo de alunos da graduação teve duração de quatro anos e foi feita com base em um corpus que foi selecionado a partir das editoras. Foram lidos e fichados todos os romances publicados no Brasil nos períodos de 1965-1979 e 1990-2004, pelas editoras consideradas mais importantes no campo literário para os dois períodos: José Olympio e Civilização Brasileira para o primeiro, e Companhia das Letras, Record e Rocco para o segundo. Por meio da leitura de 389 romances, escritos por 242 autores diferentes, foi possível colher informações sobre 1754 personagens e analisá-las de acordo com alguns critérios pré-estabelecidos, como o sexo, a cor, a posição na narrativa, a condição social, entre outros. A pesquisa foi dividida em duas etapas. Primeiramente, foram estudados os romances referentes aos anos de 1990-2004, e num segundo momento os romances relativos aos anos 1965-1979.

RESULTADOS:
Percebeu-se um grande aumento nas publicações no período de 1990-2004 em relação ao período de 1965-1979 e no número de mulheres escritoras. Notou-se que o privilégio de escrever ainda permanece entre os brancos e que os autores que publicam livros no período de 1990-2004 são mais jovens além de se concentrarem ainda mais no eixo Rio-São Paulo. Embora o número de escritoras tenha aumentado, é notável a diminuição no número de personagens femininas. Embora o número de brancos tenha aumentado no período de 1990-2004, apenas nessa época aparecem personagens negras, do sexo feminino, protagonistas e narradoras e nota-se também um pequeno aumento no número de negros, porém, tal fato pode ser creditado ao fato de ter aumentado o número de bandidos retratados nos romances mais recentes. A representação da classe econômica recai sobre as personagens de classe média e abre-se um espaço para a elite econômica. Além disso, percebe-se que os heterossexuais ganham mais espaço e passam a ocupar posições de narradores e protagonistas. Por fim, as mulheres, no quesito profissão possuem empregos considerados de baixo prestígio social, enquanto os homens exercem as profissões relacionadas ao intelecto, porém, vale lembrar que se o homem for negro, geralmente ele será bandido.

CONCLUSÕES:
O campo literário não está livre de preconceitos e aberto às diversidades como se costuma pensar, na verdade, ele está impregnado de conceitos e ideologias que marginalizam uma parte da população e reverenciam as classes dominantes. Observa-se que, o autor escreve apenas sobre a sua realidade de vida e para um determinado público. É muito provável que um dos motivos para as pessoas que são vistas de forma marginalizada, como foi observado nos dados colhidos pela pesquisa, não se sintam capazes ou a vontade para escrever seja porque eles não conseguem se interessar por algo que não retrata o seu mundo, o que também pode ser um grande motivo para o baixo índice de interesse em literatura que se observa entre as pessoas das classes mais baixas. É claro que houve mudança na literatura, que os negros, mulheres, índios e homossexuais ganharam mais espaço, mas ainda não o suficiente, não o de igualdade. Embora os números tenham crescido, eles ainda são muito baixos e com muita disparidade entre o homem idealizado pelo mundo contemporâneo e retratado pelo romance brasileiro. A literatura, ao concordar com a ausência na hora de retratar certos perfis existentes na sociedade brasileira assume status de veículo de informação impregnado de idealismos e preconceitos, pois é mais fácil, de fato, ignorar o que é difícil de discutir e correr o risco de encontrar muitas pessoas com diferentes pontos de vista.

Instituição de fomento: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq e Universidade de Brasília

Trabalho de Iniciação Científica

Palavras-chave:  Literatura Brasileira Contemporânea, Romance Brasileiro, Personagens do Romance

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