60ª Reunião Anual da SBPC




F. Ciências Sociais Aplicadas - 10. Comunicação - 67. Jornalismo e Editoração

CULTURA CIENTÍFICA: UMA ANÁLISE QUANTITATIVA DE REPORTAGENS DE CIÊNCIA NA REVISTA PIAUÍ

Mateus Yuri Ribeiro da Silva Passos1, 2, 3
Érica Masiero Nering2
Juliano Maurício de Carvalho2

1. Departamento de Ciência da Informação / UFSCAR
2. Departamento de Comunicação Social / UNESP
3. Departamento de Teoria Literária / UNICAMP


INTRODUÇÃO:
Lançada em outubro de 2006, a revista "piauí" destacou-se no cenário editorial brasileiro ao dedicar-se à cobertura de temas variados por meio do jornalismo literário ou narrativo. Tendo por base o conceito de cultura científica, ou seja, das diversas iniciativas de reintegração da atividade científica à cultura geral, nosso objetivo foi caracterizar o grau de diversidade e complexidade das reportagens relacionadas a ciência e tecnologia na revista, que cobre assuntos diversos - de música e arquitetura a genética e filosofia. Partimos do princípio de que o jornalismo literário, ao fazer uso de um estilo narrativo que contempla descrições, digressões, uso de cenas e diálogos, entre outras caracteríticas enumeradas por Norman Sims, Thomas B. Connery e Tom Wolfe, entre outros autores da área, é um meio de registro expandido da realidade, que permite tratar de forma mais complexa e humanizada a atividade do cientista, permitindo maior compreensão e empatia com esta por parte do público geral.

METODOLOGIA:
Para efetivar a caracterização, lançamos mão de uma avaliação quantitativa, por meio da análise de conteúdo dos doze primeiros números da publicação, correspondente a seu primeiro ano de circulação. Quantificamos o número de reportagens e páginas dedicadas à ciência a cada edição, a recorrência de seções ou "chapéus" atribuídos às reportagens e a distribuição das reportagens por áreas do conhecimento (dividas em Ciências Naturais, Humanas e Tecnológicas) e especialidades. Elegemos também 15 elementos característicos da pesquisa científica (dentre eles a menção de estudantes, pesquisadores, agências de fomento, materiais, métodos, instituições de ensino e/ou pesquisa, pesquisadores e teorias concorrentes, formação de cientistas e crítica pessoal do repórter) e verificamos sua recorrência em cada texto, de modo a caracterizar representações de ciência de modo mais completo ou complexo.

RESULTADOS:
A distribuição de reportagens científicas não ocorreu de maneira homogênea. Houve picos em volume de material nas edições 6, 7 e 12 (cerca de 20% do volume informativo da revista), em contraste aos números 1, 3 e 10, em que houve a menor presença. Encontramos, dentre as Ciências Humanas maior variedade temática, com 5 especialidades, enquanto se identificaram 3 especialidades distintas de Ciências Naturais e 2 de Ciências Tecnológicas, das quais houve maior presença da tecnologia utilitária. As reportagens de Ciências Tecnológicas foram mais rasas, atendo-se em geral às aplicações e beneficiários das tecnologias (100%) e a produtos tecnológicos em si (83,33%). Nas reportagens de Ciências Humanas houve uma freqüência alta de aplicações e benefícios (66%), instituições de pesquisa (66%), métodos e processos (55,55%) e pesquisadores (77,78%). O material de Ciências Naturais apresentou maior grau de complexidade e profundidade de cobertura, sobretudo no tocante a aplicações e benefícios (100%), explicação de conceitos (100%), instituições de pesquisa (100%), pesquisadores (100%), materiais (87,5%) e métodos e processos (87,5%). A perspectiva crítica está presente nas reportagens de Ciências Naturais (87,5%) e Humanas (66%), indicando maturidade e qualidade da cobertura nessas áreas.

CONCLUSÕES:
A complexidade do jornalismo científico praticado em piauí, especialmente no tocante às Ciências Naturais, acena para um modelo direcionado não para uma transferência verticalizada de conhecimento, de especialistas para leigos, mas integrada, permitindo melhor compreensão e crítica daquilo que concerne às atividades de pesquisa e desenvolvimento. Em relação à cultura científica, notamos grandes avanços em relação à interação com a cultura em geral (por meio de uma publicação de baixa segmentação editorial), da explicação de conceitos, da presença de finalidades concretas na forma de aplicações e beneficiários e da narração de métodos e processos de pesquisa científica e da abertura à controvérsia, elementos importantes para uma desmistificação da atividade. Como em nenhuma edição houve número de reportagens de ciência superior a três, a cobertura da área obteve seu equilíbrio ao estar imersa junto a conteúdos de outros campos, como política e música, sem predominar ou ser sufocada por eles. A maior deficiência ainda está na baixa freqüência em reportagens de conteúdo relacionado ao processo de formação de pesquisadores, o que traria grande contribuição para uma cultura científica, ao mostrar de modo humanizado – e portanto mais próximo e palpável à experiência do leitor – como um indivíduo torna-se cientista.



Palavras-chave:  Jornalismo literário, Jornalismo científico, Análise de conteúdo

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