Eng. Agrônomo, Entomologista, Filósofo MBA, MSc, PhD
Pesquisador e Diretor da Epagri/Cepea – Cidade das Abelhas
Professor da Sociedade dos Educadores Giordano Bruno do Brasil
horst@epagri.rct-sc.br ou kalvelage@linhalivre.net
Johann Friedrich Theodor Müller, mais conhecido como Fritz Müller, nasceu na aldeia de Windischolzhausen, próximo a Erfurt, na Alemanha, em 31 de março de 1822.
Segundo Costa e Espindola (2004), Fritz Müller em 1840 e 1841 estudou como aprendiz de farmácia, influenciado pelo seu avô materno, um honrado químico. Ainda em 1841 iniciou a sua vida universitária. Estudou matemática e ciências naturais e recebeu o grau de doutor em filosofia aos 22 anos de idade com a tese “As sanguessugas dos arredores de Berlim”. Em 1845 foi aprovado em concurso para professor ginasial em Erfurt e apesar de ter assumido o cargo, sua carreira durou pouco. As perseguições políticas aos religiosos de pensamento liberal eram severas e Fritz Müller não tinha na época muita opção, tinha que ensinar o que o governo queria. Diante de seu propósito de jamais ser hipócrita (“sempre que tiver de falar, hei de dizer a verdade” – frase em carta enviada ao irmão August), abandonou seu emprego. Ainda em 1845 foi estudar medicina e tornou-se sócio de uma comunidade liberal e secretário do Partido Democrata, do qual participavam estudantes e operários que protestavam contra o poder do Imperador Frederico “O Grande”. Foi neste mesmo período que optou por não ser mais cristão (o avô e o pai eram pastores protestantes) e frisava “eu odeio os hipócritas que trazem um credo nos lábios e um bem diferente no coração......” (citado em carta ao irmão August). Fritz Müller na sua indignação se referia às instituições religiosas da época e não a religião em si, pois acreditava em Deus e dizia que para senti-lo bastava observar a natureza. Em 1848 conheceu sua companheira Karoline Töellner com quem passou a viver. Em 1849 nasceu sua primeira filha, Louise, e naquele mesmo ano terminou o curso de medicina.
Contudo, não colou grau por discordar e se negar a pronunciar as palavras cristãs que foram acrescentadas na época ao juramento de Hipócrates “... que assim me iluminai Deus em seu sacrossanto evangelho” (Pinto, 1979).
Sem poder exercer a medicina, voltou a lecionar, mas dessa vez como professor particular. Em 1852 nasceu sua segunda filha, Johanna. Alguns dias depois morreu a primogênita. Ainda neste ano Fritz Müller leu um livreto escrito pelo Dr. Blumenau, no qual divulgava a colônia no Brasil. Era o que faltava, Fritz Müller decidiu emigrar. “Nessa intolerância religiosa vigente no país de Frederico não se poderia esperar por enquanto alguma mudança, então decidi emigrar. Escolhi o Brasil, primeiramente por sua rica flora e fauna, em segundo lugar porque acreditava que aqui a índole alemã poderia se conservar mais facilmente do que entre os ianques e em terceiro lugar porque o fundador da Colônia Blumenau, já me era conhecido de muitos anos”. Em 19 de maio de 1852 embarcou para o Brasil a bordo do veleiro Florentin, juntamente com a sua família e o irmão August que também trouxe a família. Dois meses depois chegaram ao Brasil, atracando no porto de São Francisco do Sul (Litoral Norte de Santa Catarina) e em 22 de agosto chegaram em Blumenau (SC). Os irmãos Müller foram os primeiros colonos da região do Garcia, abriram clareiras e construíram suas cabanas com troncos, ripas, folhas de palmeiras e cipós (Costa e Espindola, 2004).
Começou ali a saga de Fritz Müller no Brasil. Teve dez filhos, destes apenas um filho homem que faleceu poucas horas após o nascimento. Nos quatro primeiros anos que viveu em Blumenau, ajudou a construir a colônia, pesquisou a flora e a fauna. Como médico atendeu os casos mais urgentes e sempre manteve um relacionamento amistoso com os índios que o protegiam contra os animais selvagens enquanto pesquisava a natureza. Fritz Müller publicou mais de 250 trabalhos científicos e uma coletânea de poesias infantis, além de inúmeras notas e artigos. Em 1856 partiu para Desterro (hoje Florianópolis (SC)) por imposição do Dr. Blumenau que estava descontente com o comportamento “antireligioso” de Fritz Müller que começava a influenciar os demais colonos. Em Desterro, lecionou no Liceu Provincial por nove anos, e morou na praia-de-fora (hoje beira-mar norte). Para assumir o cargo de professor, por imposição legal, mas sem causar contrariedade a Fritz Müller, naturalizou-se cidadão brasileiro em 09 de agosto de 1856, deixando desta forma de ser cidadão alemão. Retornou a Blumenau em 1865, foi pesquisador itinerante do Museu Nacional do Rio de Janeiro, trocou inúmeras correspondências com Charles Darwin ao qual dedicou um trabalho com crustáceos realizado em Desterro, reforçando as idéias de Darwin. Recebeu dois títulos de Doutor Honoris Causa de universidades alemãs (Bonn e Tübingen). Foi juiz de paz em Blumenau (SC) e presidente da Câmara de Vereadores. Fritz Müller veio a falecer no dia 21 de maio de 1897, aos 75 anos, em Blumenau (SC). Em 1966, a 18a Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência foi em sua homenagem e inúmeros trabalhos foram publicados a seu respeito, em especial sobre os seus trabalhos científicos (Correa, 1966; Froehlich, 1966a,b; Mendes, 1966; Mimura, 1966; Nogueira Neto, 1966; Petersen, 1966; Piza, 1966; Sawaya, 1966a,b,c). Outros autores, além da parte científica, abordam aspectos da sua vida e filosofia, e suas relações com Charles Darwin (Cabral, 1966; Silva, 1966; Haeckel, 1979; Pinto, 1979; Zillig, 1997; West, 2003; Costa e Espindola, 2004). Vários textos citam a sua condição de filósofo, exemplo de dignidade, ética na relação humana e com a natureza e a sua ferrenha defesa pela liberdade. Com relação a isso Fritz Müller dizia: “sem liberdade não há verdade e nem virtude” e “... tomei a firme decisão de tudo sacrificar pela verdade e pela liberdade” (trechos extraídos de cartas de Fritz Müller enviadas ao irmão August).
Bibliografia
Cabral, O.R. Permanência de Fritz Müller na antiga Desterro. Ciência e
Cultura 18(4):400-404. 1966.
Costa, A.S.; Espindola, M. O cidadão brasileiro Fritz Müller. FAEMA –
Prefeitura Municipal de Blumenau, Blumenau. s.p. , 2004. (Texto do Museu de Ecologia Fritz Müller).
Correa, D.D. Os celenterados estudados por Fritz Müller. Ciência e Cultura
18(4):382-383. 1966.
Froehlich, C.G. Fritz Müller e os insetos aquáticos. Ciência e Cultura
18(4):384-386. 1966a.
Froehlich, E.M. Anelídeos e turbelários estudados por Fritz Müller. Ciência e
Cultura 18(4):390-392. 1966b.
Haeckel, E. Fritz Müller – Desterro: dois necrológicos. Fundação Casa Dr.
Blumenau, Blumenau. 16p. 1979.
Mendes, E.G. Aspectos fisiológicos da obra de Fritz Müller. Ciência e Cultura
18(4):375-378. 1966.
Mimura, I. Alguns aspectos da flora brasileira estudados por Fritz Müller.
Ciência e Cultura 18(4):396-399. 1966.
Nogueira Neto, P. Fritz Müller e as abelhas brasileiras. Ciência e Cultura
18(4):379-381. 1966.
Müller, F. História natural de sonhos. Nauemblu, Blumenau. 56p. 2004.
(tradução de Lia Carmen Puff e Dennis Radünz).
Petersen, J.A. Hemicordados, protocordados e vertebrados estudados por Fritz
Müller. Ciência e Cultura 18(4):393-395. 1966.
Pinto, E.R. Glória sem rumor: o sábio Fritz Müller. Fundação Casa Dr.
Blumenau, Blumenau. 2ed. 40p. 1979.
Piza, S.T. Fritz Müller e Darwin. Ciência e Cultura 18(4):373-374. 1966.
Sawaya, P. Fritz Müller e sua obra. Ciência e Cultura 18(4):361-368. 1966a.
Sawaya, P. Contribuição de Fritz Müller para a biologia na segunda metade do
século passado. Ciência e Cultura 18(4):369-372. 1966b.
Sawaya, M.P. Fritz Müller e seus estudos sobre os crustáceos. Ciência e
Cultura 18(4):387-389. 1966c.
Silva, J.F. da. Homenagem prestada ao sábio-médico naturalista Fritz Müller
pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Ciência e
Cultura 18(4):405-406. 1966.
West, D.A. Fritz Müller: A Naturalist in Brazil. Blackburg, Pocahontas Press.
376p. 2003.
Zillig, C. Dear Mr. Darwin: a intimidade da correspondência entre Fritz
Müller e Charles Darwin. São Paulo, Sky/Anima. 163p. 1997.