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Neurobiologia do Transtorno de Pânico
Frederico Guilherme Graeff
Universidade de São Paulo (USP)
 

Pós-Graduação de Saúde Mental da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo.

O transtorno de pânico (TP) caracteriza-se por ataques de pânico espontâneos e recorrentes, que se manifestam por medo intenso e manifestações somáticas acentuadas.

Compreende também ansiedade antecipatória, motivada pelo receio de que um novo ataque possa ocorrer e comportamento de esquiva de situações em que ter um ataque é embaraçoso, a qual pode se tornar generalizada, constituindo a agorafobia. Já o transtorno de ansiedade generalizada (TAG) é uma condição crônica caracterizada por expectativa apreensiva, preocupações excessivas e manifestações somáticas moderadas. A resposta medicamentosa dos dois transtornos é diferente: enquanto o TAG melhora rapidamente com doses baixas de ansiolíticos benzodiazepínicos, o TP responde a antidepressivos que inibem a recaptação de serotonina (5-HT), somente quando dados cronicamente. Isto sugere que o substrato neural dos dois transtornos é diferente.

Estudando-se o papel da serotonina (5-HT) nesses transtornos, verificou-se que ela influencia o TP e a TAG de modo oposto. Por exemplo, resultados com testes de conflito em animais de laboratório, que são modelos de TAG, indicam que a 5-HT é ansiogênica, enquanto que os obtidos com estimulação elétrica intracerebral aversiva da matéria cinzenta periaquedutal (MCP), teste considerado como modelo de TP, sugerem ação antipânico. No labirinto em T-elevado, modelo animal capaz de gerar duas tarefas consecutivas: esquiva inibitória, modelo do TAG e fuga de uma via, modelo do TP, foram obtidos resultados concordantes com esta hipótese. Assim, manipulações farmacológicas que aumentam o funcionamento da via serotonérgica que parte do núcleo dorsal da rafe e inerva tanto estruturas prosencefálicas, que regulam a ansiedade (e. g., amídala), como a MCP, geradora dos ataques de pânico, facilitam a esquiva (efeito ansiogênico) e prejudicam a fuga (efeito antipânico). Ao contrário, tratamentos que diminuem o funcionamento da mesma via têm efeito ansiolítico, na esquiva e panicogênico, na fuga.

Evidências colhidas no ser humano apontam na mesma direção, dado que ensaios clínicos controlados mostraram que o antagonista de receptores tipo 5-HT2, ritanserina melhora o TAG, porém agrava o TP. Além disso, testes de ansiedade experimental, realizados em voluntários sadios, mostraram que fármacos facilitadores da ação da 5-HT amplificam a resposta condicionada de condutância elétrica da pele, representativa do TAG, enquanto reduzem de medo de falar em público, cuja resposta farmacológica coincide com a do TP. Em contraste, tratamentos que reduzem a ação da 5-HT atenuam a ansiedade condicionada e acentuam o medo de falar em público. Tais resultados consubstanciam a sugestão de que a 5-HT aumenta a ansiedade, atuando no prosencencéfalo e atenua o pânico, na MCP. A verificação de que o tratamento crônico com drogas antidepressivas, que é eficaz no TP, aumenta a sensibilidade de receptores 5-HT1A e 5-HT2 na MCP constitui indício de que o efeito terapêutico antipânico desses agentes seja devido à inibição pela 5-HT do desencadeamento de ataques de pânico na MCP.

Pacientes com TP reagem exageradamente a sinais corporais, dando interpretação catastrófica a estímulos interoceptivos normais. A psicoterapia cognitivo-comportamental visa desenvolver a resistência a tal estimulação. Resultados recentes de neuroimagem estrutural, obtida através da ressonância magnética nuclear, mostraram aumento de volume da matéria cinzenta na ínsula e diminuição no cíngulo anterior em pacientes de pânico, quando comparados com controles sadios.

Como evidências fisiológicas indicam que tais regiões executam um processo de avaliação que atribui significado emocional negativo à informação interoceptiva, pode-se supor que elas estejam implicadas na vulnerabilidade a ataques de pânico e na ação terapêutica da intervenção psicológica.

Apoio financeiro do CNPq (Bolsa de Produtividade em Pesquisa) e da FAEPA, fundação do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto.

Palavras-chave: pânico; ansiedade; .
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006