F. Ciências Sociais Aplicadas - 4. Direito - 9. Direito Penal |
|
UMA ANÁLISE DO DISCURSO DA LEI N° 6.368/76 E SUA EFICÁCIA NA INIBIÇÃO DO USO INDEVIDO E NO TRÁFICO DE ENTORPECENTES |
|
Igo Leonardo Mendonça Souza 1 |
Thiago Luís Soares Fontenelle 1 |
Edith Barbosa Ramos 1 |
|
(1. Departamento de Direito, Universidade Federal do Maranhão / UFMA) |
|
|
INTRODUÇÃO: |
Partindo-se de uma análise discursiva da lei n° 6.368/76, que dispõe sobre as medidas de prevenção e repressão ao tráfico ilícito e uso indevido de substâncias entorpecentes ou que determinem dependência física/psíquica, objetivou-se demonstrar que o modelo repressivo adotado não constitui forma eficaz de combate à utilização e tráfico dessas substâncias. Desde meados de 1930, a preocupação legislativa com a questão das drogas associa-se substancialmente à repressão. Pretende-se demonstrar nesta pesquisa a impropriedade de se tratar o assunto com políticas centradas no binômio repressão/abstinência que, após anos de violência, consomem recursos públicos sem resultado eficaz. Com efeito, o abuso das drogas é sintomático de questões não tratadas pela sociedade e pela lei. A lei não trata da depressão subjacente ao próprio indivíduo, de outras desordens que o acometem e que não sejam relacionadas ao abuso, não impedindo o retorno para o consumo ou a prática de outros delitos. Assim, o caminho da drogadição - abuso das drogas - passa também pela necessidade de atendimento às exigências sociais, o que não raro é desconsiderado pelo legislador. A ineficácia estatal em lidar com o problema através da repressão, aliada ao crescimento do número de usuários, de novas drogas, novas pressões e novas violências, que marginalizam e se impõem como respostas mal dadas e discursos silenciados: são essas as preocupações desta pesquisa. |
|
METODOLOGIA: |
Inicialmente, foram analisados os dispositivos legais ínsitos na lei n° 6.368/76, a saber: o modelo de prevenção, de tratamento, de recuperação, os crimes, as penalidades e o procedimento criminal. Posteriormente, destes dispositivos abstraíram-se influências históricas que os condicionaram ideologicamente. Em seguida, foram admitidos pressupostos clínicos de tratamento de dependentes, tais como a voluntariedade no tratamento (excepcionado casos considerados extremos), tratamento de questões subjacentes – p.ex. física-psicológicas, sociais, culturais e econômicas, – que envolvam a procura ou o vício, e a normalidade da “reincidência” no tratamento de dependentes. Através do método especulativo, observou-se a partir destes pressupostos, em que sentido o modelo repressivo contido na lei °6.368/76 constitui-se em dispositivo eficaz e adequado para o combate à utilização e tráfico de substâncias consideradas ilícitas. |
|
RESULTADOS: |
As preocupações legislativas com drogas são contemporâneas de eras marcadas por períodos autoritários. Ressalta-se, p. ex., o Decreto-Lei n° 891/1938, que trouxe concepção criminalizadora ao incorporar-se no artigo 281 do Código Penal. Diversas mudanças culminaram na lei n° 6.368/1976, estabelecida na Ditadura Militar de 1964. Baseada no espírito da Segurança Nacional, embora com avanços (p. ex. não criminalizar o usuário), é fundamentalmente criminalizadora (criminaliza o porte de drogas sem distinguir usuário de traficante). Quanto à prevenção, ressalta-se a criação do Sistema Nacional Anti-Drogas em 1988. Sua localização junto ao Gabinete Militar da Presidência da República, atual Gabinete de Segurança Institucional, revela ainda o caráter repressor. Hoje, quem exerce esse papel é a Secretaria Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, sucessora da SENAD, lotada no Ministério da Justiça. Percebe-se, através da lei em comento, uma supervalorização dos crimes ante suas respectivas penas. Neste ponto, ressalta-se a possibilidade de punição do usuário e/ou dependente. Quanto ao procedimento criminal, destaca-se que o exame de dependência é feito, quando requerido, após o interrogatório. No tocante ao tratamento, a lei cuida do usuário como dependente, distinguindo-se apenas o grau: quando complexo, necessita de internação e, quando simples, propõe tratamento extra-hospitalar. Ainda faculta ao juiz a internação hospitalar em caso de frustração do tratamento ambulatorial. |
|
CONCLUSÕES: |
Com a prevalência do discurso repressor, mostra-se ineficaz a lei n° 6.368/76. Esta ideologia difunde o medo que antecipa a inviabilização de debates menos superficiais. Cabe articular um modelo preservador dos direitos humanos e que dê atenção aos usuários de drogas reduzindo danos à sua saúde e à sociedade. A lei apresenta uma norma penal em branco, remetendo ao Ministério da Saúde a responsabilidade de enumerar as drogas ilícitas. Entretanto, o Ministério não faz constar certas substâncias que também trazem riscos à saúde e segurança dentre as ilícitas. Autores de crimes, sob o efeito de substância entorpecente ou que determine dependência proveniente de caso fortuito ou força maior que, ao tempo da ação ou omissão, eram incapazes de entender o caráter ilícito do fato e de determinar-se por esse entendimento são isentos de pena. Propõe-se regulamentar a lei de modo a se evitar danos à saúde do dependente, bem como à sociedade e estabelecer uma política pública de tratamento dos usuários. O procedimento criminal deveria exigir como requisito de admissibilidade da denúncia não só a comprovação de que se trata de substância ilícita, mas também a não-dependência do indiciado. A lei viola o Princípio da Alteridade (pelo qual o crime deve necessariamente interferir no âmbito de outrem, não sendo punível quando prejudicar apenas seu autor), além dos pressupostos de tratamento que prevêem a voluntariedade, o restabelecimento de questões subjacentes e a normalidade da reincidência. |
|
Instituição de fomento: Programa de Educação Tutorial
|
|
Trabalho de Iniciação Científica
|
|
Palavras-chave: Drogas; Discurso; Direito e a lei n° 6.368/76. |
|
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006 |
|