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G. Ciências Humanas - 3. Filosofia - 2. Filosofia

CONSIDERAÇÕES SOBRE A EPISTEMOLOGIA QUINEANA

Raimundo Portela Filho 1
Carmem Almeida Portela 1
(1. DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA, UFMA, SÃO LUÍS/ MA)
INTRODUÇÃO:
Willard van Orman Quine (1908-2000) ocupa um lugar destacado entre os grandes filósofos de todos os  tempos devido à natureza, profundidade, extensão, caráter polêmico e original de seu pensamento. Sustenta-se aqui que a filosofia quineana constitui um sistema filosófico, de modo que as suas diversas teses separadas da totalidade do seu sistema podem perder o seu significado e possibilitar interpretações mal fundamentadas ou errôneas. Com efeito, para uma compreensão adequada e a mais objetiva possível do pensamento quineano, é preciso estabelecer relações sistemáticas entre as várias teses de sua filosofia, de sorte que elas adquiram um significado e assumam um valor-de-verdade no interior de seu sistema filosófico. O presente trabalho não objetiva efetivar uma exposição e análise de todo o sistema filosófico quineano. Admite-se aqui, de acordo com comentadores, que tal sistema filosófico é uma tentativa de responder a seu projeto epistemológico. Abordam-se, então, alguns aspectos de sua concepção epistemológica.
METODOLOGIA:
Alicerçando-se em alguns textos de Quine e de comentaristas, realiza-se uma pesquisa bibliográfica, na qual se expõem algumas características relevantes da epistemologia quineana, incluindo-se aí as concepções de holismo epistemológico e de epistemologia naturalizada. Parte-se de considerações acerca do assim chamado projeto epistemológico quineano, que se apóia em três pressupostos básicos, a saber: 1- a certeza de que o único critério de evidência que não se pode questionar é a evidência empírica; 2- a constatação de que todos têm uma teoria de mundo; 3- a crença de que a nossa teoria de mundo se expressa somente através de uma rede de enunciados, organizável de diferentes maneiras, mantendo, todavia, uma unidade e que resume tudo o que podemos conhecer do mundo exterior e do interior. Por último, formulam-se algumas conclusões fundamentadas na exposição apresentada. 
RESULTADOS:
O projeto epistemológico quineano  busca responder à seguinte pergunta: “dada somente a evidência de nossos sentidos, como chegar a nossa teoria de mundo?” Segundo Quine, teoria de mundo é a totalidade de nossas visões de mundo, incluindo-se as de senso comum, as científicas e as filosóficas, sendo que as duas últimas  distinguem-se da primeira apenas pelos seus graus de complexidade lingüística e analítica. A seu ver, nenhuma visão de mundo é ingênua tampouco é capaz de refletir a realidade como um espelho. O problema que se coloca aos epistemólogos é o da justificação das relações entre o nosso discurso e a realidade, entre as palavras e os objetos. Uma teoria, na perspectiva quineana, consiste em um sistema de enunciados ordenados conforme regras bastante exatas, fazendo parte de um sistema lingüístico que lhes atribui significado e grau de verdade. Quine assevera que o nosso conhecimento revela-se através do discurso. Desse modo, o conhecimento está imbricado na estrutura da linguagem, o que nos torna prisioneiros do discurso. Compreende-se, por conseguinte, a escolha da abordagem da questão epistemológica que lhe interessa, pelo viés da análise da linguagem, pelo procedimento da filosofia analítica. Quine admite, outrossim, que se deve seguir em Epistemologia e na Lingüística o método de trabalho das ciências naturais, rejeitando-se todas as análises que recorram a entidades mentais ou não-observacionais.
CONCLUSÕES:
Quine argumenta que as teorias ultrapassam os dados observacionais e dependem amplamente dos componentes culturais do contexto onde surgem. As observações científicas e as de senso comum estão sempre ligadas ao quadro teórico no qual ocorrem. Torna-se impossível distinguir no discurso o que decorre de informações provenientes diretamente dos dados sensíveis e que é conseqüência de construções teóricas muito sofisticadas. Ele considera todos os enunciados passíveis de revisão. Os pressupostos acima apóiam a tese quineana do holismo epistemológico, segundo a qual os enunciados sobre o mundo exterior enfrentam o tribunal da experiência sensível não individualmente, mas como um todo bem estruturado. Ademais, ele propõe que a epistemologia se naturalize, que ela se coloque como um capítulo da psicologia e se torne uma ciência natural, desde que ela estuda um fenômeno natural: o homem, um objeto físico entre outros, que estimula as suas terminações nervosas e o leva a responder com um discurso que é ele mesmo um objeto físico. Sugere Quine que a única alternativa que resta aos epistemólogos para tratar da questão da relação discurso-realidade, após o malogrado sonho reducionista dos empiristas de representar o mundo exterior como uma construção lógica a partir dos dados sensíveis, reside na consecução de um trabalho interdisciplinar envolvendo, dentre outros profissionais, epistemólogos, psicólogos, lingüistas e neurologistas.              
 
Palavras-chave: Quine; Holismo Epistemológico; Epistemologia Naturalizada.
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006