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G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 3. Psicologia Clínica

Crenças parentais e a não adesão ao atendimento infantil: Desafios da Terapia comportamental cognitiva (TCC)

Leonardo Gomes Bernardino 1
Lucas Guimarães Cardoso de Sá 1
Simone Aparecida dos Santos 1
(1. Instituto de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia (IPUFU))
INTRODUÇÃO:
A terapia cognitivo-comportamental (TCC) sugere que o afeto e o comportamento são, em grande parte, um produto de cognições. A TCC tem seu modelo de intervenção aplicado a diversas faixas etárias. No entanto, as contingências terapêuticas são distintas para cada uma delas. Com crianças e adolescentes existem particularidades quanto à prática, as quais são relevantes e deve-se atentar para que o tratamento tenha efeitos positivos. Uma delas diz respeito ao senso de auto-controle do processo terapêutico. As crianças e adolescentes raramente iniciam a terapia e não decidem sobre a duração total do processo e seu encerramento diante da não mais necessidade, o que geralmente cabe aos pais. A TCC exige que os pais sejam sujeitos ativos na mudança que solicitam, engajando-se no tratamento, o que pode ser determinante para o sucesso ou fracasso do mesmo. É preciso conhecer as diversas variáveis de cada caso, identificando como cada uma pode colaborar para o encerramento precoce da terapia. O presente relato de dois casos clínicos tem como objetivo ilustrar as dificuldades no atendimento do público infantil e adolescente, bem como identificar hipóteses que podem levar à não adesão num processo terapêutico.
METODOLOGIA:

Os atendimentos psicoterápicos aqui descritos foram realizados no Centro de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia. O primeiro relato é de um adolescente (13 anos) do sexo masculino, cuja queixa inicial era de acessos de raiva, irritabilidade extrema e choro excessivo. A conceitualização de caso indicou um quadro depressivo com sintomas somáticos, retraimento social, baixa auto-estima, dificuldades acadêmicas e enfrentamento inadequado. Já o segundo caso é de uma criança (8 anos) do sexo masculino, com queixa inicial de dificuldade em permanecer longe de sua mãe, dificuldades para ir à escola, não dormir no próprio quarto e medo generalizado. A conceitualização do caso indicou um quadro de ansiedade de separação, que é uma ansiedade excessiva de uma criança com relação à separação de uma figura de ligação, com freqüência a mãe. O processo interventivo de ambos envolvia uma orientação de pais semanal, na qual a família era orientada sobre mudanças contingenciais necessárias para a efetividade do tratamento.

RESULTADOS:

No primeiro caso, o adolescente participou, em conjunto com orientação familiar, de 15 sessões. Após a décima sessão os relatos, tanto do adolescente quanto dos familiares, indicavam uma melhora substancial do quadro depressivo. Ele já conseguia generalizar o repertório comportamental mais adaptativo aprendido para outros contextos. Alguns dos avanços obtidos foram: diminuição das dores de cabeça e comportamento de mentir, controle da raiva e diminuição das brigas com os irmãos (de uma ou duas brigas por dia com agressão física para uma por semana sem agressão). Isso resultou na diminuição da freqüência à terapia e seu posterior abandono, provavelmente porque os responsáveis desenvolveram a crença de que as metas já haviam sido alcançadas e que o adolescente não mais se beneficiaria do tratamento. No segundo caso, o tratamento foi interrompido após 10 sessões. Nesse caso, a mãe apresentava um quadro depressivo, o que reforçava o comportamento disfuncional da criança em permanecer perto dela para “ajudá-la” na sua depressão, já que esta obtinha uma série de ganhos como atenção integral e não ir à escola quando não quisesse. Isso impedia que a criança percebesse seus comportamentos como desadaptativos. Ainda havia crenças dos pais com respeito à ineficiência da intervenção terapêutica, visto que a mãe já havia passado por um processo terapêutico ineficaz. O resultado foi a desmotivação tanto da criança quanto dos pais, que acabaram decidindo pela interrupção do tratamento.

 

CONCLUSÕES:

Estes casos elucidam alguns pontos para o uso de TCC com crianças e adolescentes. O terapeuta deve estar atento quanto aos ganhos do paciente com a manutenção de seus problemas, pois se estes forem mais significativos do que os ganhos com a mudança terapêutica, poderá ocorrer uma não adesão e baixa motivação para o tratamento, como aconteceu com os pais da criança com ansiedade de separação. Outro ponto fundamental é o engajamento dos pais na terapia até o final estabelecido pelo terapeuta e não pela própria percepção de melhora, uma vez que o trabalho de manutenção e desvinculação gradual são tão importantes quanto o processo terapêutico em si, o que não aconteceu com os pais do adolescente com sintomas depressivos. O terapeuta, ao longo das sessões deve sempre informar sobre essa necessidade e manter a motivação para a continuação do tratamento mesmo na ausência de sintomas, pois é preciso que eles se mantenham assim e se generalizem para outros ambientes. Dessa forma, conclui-se que a TCC é um instrumento valioso para o tratamento de crianças e adolescentes, mas apresenta como toda terapia, diversas variáveis que não podem ser negligenciadas.

 
Palavras-chave: Terapia Comportamental Cognitiva; Adesão à Terapia; Crianças e Adolescentes..
Anais da 58ª Reunião Anual da SBPC - Florianópolis, SC - Julho/2006