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G. Ciências Humanas - 8. Psicologia - 11. Psicologia Social | ||
PERCEPÇÕES DA MORTE E DO MORRER EM AGENTES FUNERÁRIOS: UM ESTUDO SOBRE IDENTIDADE | ||
Erasmo Miessa Ruiz 1 (poiesisAuol.com.br), Sarah Carvalho Cavalcante 2, Yara Maria Bernardes 2 e Narah Cristina Maia Teixeira 2 | ||
(1. Curso de Medicina, Universidade Estadual do Ceará - UECE; 2. Curso de Serviço Social, Universidade Estadual do Ceará - UECE) | ||
INTRODUÇÃO:
Os trabalhos de Phillipe Aries, Elizabeth Kubler-Hoss, Norbert Elias e Claus Inhof, sinalizam para a cisão da morte com a existência, constatando esse fenômeno no campo da iconografia, da análise filosófica ou no cotidiano do atendimento hospitalar. A falta de uma “ars moriendi” faz com que busquemos vivências embasadas na negação da morte. Se a morte acha-se exilada dos espaços públicos, os indivíduos parecem realizar um exílio da idéia da morte também em suas subjetividades. Assim, o que aconteceria quando o trabalho torna as tentativas deste exílio praticamente nulas em eficácia? Estamos aqui referindo formas específicas de trabalho onde as pessoas relacionam-se diretamente com a morte. A virtual falta de uma sociabilidade anterior em relação ao preparo para a morte exporiam estas pessoas a formas mais ou menos específicas de sofrimento psíquico? O trabalho de agente funerário seria elemento fundamental para constituir parte de suas identidades individuais? Poderíamos pensar numa ientidade coletiva de formas específicas de trabalho que tenham a morte como centro de intervenção? |
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METODOLOGIA:
Em função da especificidade do objeto, esta pesquisa revela-se como um estudo qualitativo, buscando, além de descrever o objeto, conhecê-lo. Nosso campo de pesquisa foi realizado em duas agências funerária da região metropoliana de Fortaleza. As considerações teóricas metodológicas abordadas durante a pesquisa apresentam como marco a perspectiva da Identidade tal como a abordam Erwing Goffman e Antonio da Costa Ciampa. Para a coleta de dados realizamos observações de campo sumarizadas em diário de campo e entrevistas baseadas em roteiro. Utilizamos o gravador para registro das falas dos participantes, Para a composição do banco de dados foram realizadas 10 entrevistas com agentes funerários. A análise da fala dos participantes versou sobre aspectos da sua vida pessoal, desde a infância até os dias atuais, dando-se ênfase, sobre a história laboral, com particular interesse em determinantes que levaram o indivíduo à inserção no trabalho atual, bem como ao conjunto de práticas de trabalho no cotidiano. Atentamos, assim, para a descrição das significações de práticas com vistas à categorização dos conteúdos suscitados na entrevista e nos períodos de observação, tendo como referencial a análise de conteúdo tal como sugerida por Bardin. |
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RESULTADOS:
Os entrevistados consideram o ambiente agradável e o relacionamento entre as pessoas bastante cordial. Contudo, a relação com os clientes é mais tensa pois o profissional passa a ser visto como a materialização da dor, rotulado como “aquela pessoa que ganha às custas do sofrimento alheio”. Para melhorar a relação, muitas vezes o profissional veste uma “máscara” de solicitude e cortesia. Diante dos clientes, precisam se mostrar como pessoas calmas e dispostas a ajudar Reclamam do processo de estigmatização, são recorrentemente chamados de “papa-defunto”, as pessoas recorrem a rituais de afastamento em relação a eles (bater na madeira, benzer-se, etc). Os agentes funerários expressavam medo em ter contato com cadáveres e/ou objetos mórbidos anteriormente a entrada nas funerárias. Se hoje esse medo desapareceu, isso não significa dizer que não tenham medo da morte. Referem a importância do agente funerário, pois sem eles os mortos não poderiam ser sepultados. Ainda assim, essa significação parece ser uma reação defensiva frente ao relato de como as pessoas satirizam ou expressam reações de afastamento quando reportam o que fazem. A maioria dos entrevistados afirma a crença na vida após a morte. Relatam ter aprendido a lidar melhor com a morte. Entretanto, lidar de forma objetal com os corpos parece correlacionar-se com uma compreensão objetal da morte. Assim, o trabalho não parece prepará-los para o enfrentamento da morte de pessoas próximas. Se aparentemente o medo de morrer tenha diminuído, lidar com a morte parece criar o medo de não se emocionar mais com ela. |
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CONCLUSÕES:
Simbolicamente, os agentes funerários passam a personalizar seu objeto de intervenção mas não parecem sofrer por isso. Percebem que ao reporem a identidade virtual que o grupo lhes reserva - a adjetivação de "Papa-Defunto" - isso por si amedronta aqueles que lhes lançam o estigma. Tentar valorizar socialmente o que fazem com falas que ressaltam sua importância parece, antes de tudo, uma estratégia de autovalorização. A atividade parece confgurar identidade que exigem complexo conjunto de significados para serem postas e repostas. Entretanto, existe aqui um desafio maior. Além de qualquer expressão humana, no plano da individualidade, a morte parece ser refratária à experiência vivida, pois não podemos morrer e depois retornarmos para contar como foi. Lidar com a morte, portanto, apresenta sempre um certo sentido de mistério. É esse sentido enigmático que os corpos parecem apresentar e reapresentar indefinidamente aos agentes funerários. Trabalhar com a morte parece forçar o pensar sobre a própria finitude. Podemos negar esse pensamento ou, então, sentir todo seu impacto afetivo tentando ritualizar a dor e o sofrimento. Os atores mudos e inanimados "gritam" o anseio dos agentes funerários que os manuseiam: “O que é a morte? Existirá algo depois disso tudo?” |
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Instituição de fomento: CNPq | ||
Trabalho de Iniciação Científica | ||
Palavras-chave: Tanatologia; Morte e Morrer; Identidade. | ||
Anais da 57ª Reunião Anual da SBPC - Fortaleza, CE - Julho/2005 |