GRAVIDEZ NA ADOLESCENCIA
Zenilda
Vieira Bruno
Universidade
Federal do ceará.
A gestação na adolescência é um problema mundial de
saúde pública, pois atinge principalmente a classe social mais carente e de
menor escolaridade, sendo na maioria das vezes não planejada.
Sabemos que a gravidez nesta faixa etária não é algo
novo. Maria teve Jesus com 15 anos de idade. Porém o grande diferencial é que
antes a gestação acontecia dentro da instituição do casamento. Hoje esta ocorre
primeiro, sofre todos os estresses e algumas vezes os parceiros passam a morar
juntos.
Os riscos de gestação na adolescência não são apenas
devido ao fator idade, existem riscos biológicos, porém psíquicos e sociais
bastante importantes. Quanto ao fator idade, podemos considerar duas faixas
etárias, a adolescência precoce de 11 a 15 anos e a tardia de 16 a 19 anos. È
na primeira fase que ocorrem mais riscos. Um fator é a idade ginecológica que é
menor, isto é, quanto menor a diferença entre a idade cronológica da paciente e
aquela que teve a primeira menstruação maior o risco para a gestação, devido a
imaturidade da vascularização uterina, o que acarretaria o parto prematuro ou
uma placenta insuficiente. Porém esta faixa etária coincide com a maior não
aceitação da gestação, maior postergação do início do pré-natal acarretando
falta de orientação alimentar, tratamento de anemia, infecções urinárias ou
vaginais, pré-eclampsia e também um trabalho psíquico-social.
A gravidez na adolescência traz mais problemas devido
ao início do pré-natal tardio do que esta se dar numa fase precoce da vida
reprodutiva.
As patologias mais freqüentes são: pré-eclampsia ou
eclampsia, anemia, infecção urinária ou vaginal e parto pré-maturo. Estas
ocorrem, em geral, em gestações no extremo da vida reprodutiva e na primeira
gestação. Podem ser amenizadas ou evitadas com um pré-natal bem feito.
O tipo de parto independe da idade. È errôneo
acreditarmos que a adolescente não tem “passagem“ e que deve ter cesariana.
Esta tem exatamente a mesma freqüência da mulher adulta e mais uma vez, se há
um bom preparo durante o pré-natal para o momento do parto, este ocorrerá sem
problemas salvo quando existe a indicação obstétrica formal para o parto
abdominal. A maior indicação de cesariana é a pré-eclampsia, independente da
idade e a desproporção céfalo-pélvica é raro em todas as idades.
Os riscos biológicos para o recém nascidos (RN) são
comprovadamente mais freqüentes nesta faixa etária. A prematuridade e o baixo
peso ocorrem mais em filhos de adolescentes do que de mulheres adultas. Estas
são as principais causas de morbi-mortalidade em RN. Quando o filho é bem
aceito será bem cuidado independente da idade da mãe e esta o amamentará, o
vacinará, logo não há motivos para acreditarmos que os filhos de adolescentes
adoeceram mais do que os filhos de adultas.
Maior do que os riscos biológicos são os
psíco-sociais. Em geral, a adolescente para de estudar e trabalhar, tem
sentimentos de diminuição de auto-estima, depressão e algumas vezes pensa até
em suicídio.
Vários trabalhos mostram que a baixa escolaridade é
tanto causa como conseqüência da gravidez na adolescência. Sabemos que quanto
menor a escolaridade maior probabilidade de ocorrer gestação e que esta faz com
que a adolescente pare de estudar, por vergonha das amigas, pressão da escola e
muitas vezes da família, por punição ou por acreditar que esta é a única
maneira da jovem cuidar do seu filho, ou ainda pressão do parceiro. Os meninos,
muitas vezes, param de estudar para trabalhar, para sustentar a nova família.
A própria vida conjugal muda. Em geral, a gravidez
ocorre fruto de uma relação sexual desprotegida de um casal de namorados
adolescentes, ou entre adolescente e um adulto jovem, que resolvem se unir.
Outras vezes, a gravidez é fruto de uma relação não formal e o parceiro não
assume a gestação, na maioria destes casos ocorre o aborto provocado.
Como estas relações sexuais, em geral, são
escondidas, a gravidez é a prova visível de que estas estavam acontecendo. A
situação desperta alguns sentimentos, na sua maioria, negativos, como medo,
vergonha, desespero.
O Serviço de Adolescente da Maternidade Escola Assis
Chateaubriand completou 17 anos e vem atendendo de forma multiprofissional a
adolescente na gestação e fora desta, no planejamento familiar, prevenção e
tratamento das patologias ginecológicas.
Realizamos uma pesquisa que estudou adolescentes
grávidas que levaram a gravidez à termo e aquelas que abortaram. Em alguns
momentos: na gestação, um ano e cinco anos depois, para avaliarmos o que
acontecia com estas meninas, principalmente em relação a escolaridade,
trabalho, auto-estima, vida conjugal, relação com o companheiro e fecundidade
subseqüente.
Foi um estudo longitudinal de coorte, com 367
adolescentes mães, 125 que provocaram o aborto e 71 que tinham aborto espontâneo.
Verificamos que a auto-estima da adolescente é baixa
em todos os grupos, principalmente naquele que provoca o aborto, acreditamos
que esta não tem apoio do parceiro e se sente muito mal em ter que tomar esta
atitude. Cinco anos após temos melhora da auto-estima. Provavelmente devido à
entrada na vida adulta e maior segurança de si mesmo.
Constatamos que quase 50% das gestantes pararam de
estudar. Um ano e mesmo cinco anos após poucas tinham voltado ao colégio. A
baixa escolaridade tem como conseqüência uma menor qualificação profissional e
desemprego, levando a perpetuação da pobreza.
Quanto ao trabalho, a adolescente trabalha bem menos
antes da gravidez do que um ou cinco anos após. Além de se tornar mais adulta,
ela passa a trabalhar para manter seu filho.
Diferente do que esperávamos a união conjugal não é
tão fugaz. Após a gravidez a adolescente passa a morar com seu companheiro e na
maioria das vezes permanece com este até pelo menos cinco anos, já que este foi
o tempo estudado. Observamos que 60 % das adolescentes tinham o mesmo
companheiro cinco anos após a gravidez. Aquelas que abortaram estavam com o
parceiro inicial em 40%, o que ainda é alto, visto que muitas vezes este aborto
foi pela decisão do parceiro em não ter este filho.
Verificou-se que 61% das adolescentes que pariram e
70% das que abortaram engravidaram novamente nos cinco anos seguintes da
primeira gestação. Não foram fatores protetores para esta gravidez subseqüente:
a faixa de idade, o fato de estar estudando, trabalhando, ou morando com os
pais. Entretanto, quando as adolescentes tinham oito anos ou menos de
escolaridade o risco de engravidar aumentava quase duas vezes (RR = 1,89). As
adolescentes que eram casadas ou moravam com o companheiro engravidaram menos
do que aquelas que não tinham uma união estável e aquelas que mudaram de
companheiro engravidaram mais do que aquelas que se mantinham com o mesmo
companheiro (RR = 1,4).
Alguns fatores limitaram este estudo. O mais
importante e difícil de resolver foi a mudança de endereço das adolescentes. No
decorrer da pesquisa muitas saíram de suas residências sem deixar nenhum
contato.
Concluímos que nem sempre as relações são passageiras
e que algumas vezes a gestação é programada. No decorrer do tempo os grupos
entre as que tinham filho e que abortaram ficaram bem parecidos. A grande
maioria de todas as adolescentes engravidou novamente até cinco anos após,
relacionando-se principalmente com baixa escolaridade, novos parceiros e uniões
não estáveis. É necessário maior reflexão e programas assistências aos
adolescentes, principalmente àqueles das classes mais pobres, valendo-se de
atividades que envolvam educação sexual, a formação de adolescentes
multiplicadores, um bom serviço de planejamento familiar e orientação à
contracepção.