RESILIÊNCIA
Professora Sandra Maia
Farias Vasconcelos, Dr.
Há mais de quarenta anos, a
ciência tem-se interrogado sobre o fato de que certas pessoas têm a capacidade
de superar as piores situações, enquanto outras ficam presas nas malhas da
infelicidade e da angústia que se abateram sobre elas como numa rede engodada.
Por que certos indivíduos são capazes de se levantar após um grande trauma e
outros permanecem no chamado fundo do poço, incapazes de, mesmo sabendo não ter
mais forças para cavar, subir tomando como apoio as paredes desse poço e
continuar seu caminho?
As experiências e estudos feitos
têm mostrado algumas explicações científicas sobre esse fato. A biologia
defende o ponto de vista de que cada ser humano é dotado de um potencial
genético que o faz ser mais resistente que outros. A psicologia, por sua vez,
dá realce e importância das relações familiares, sobretudo na infância, que
construirá nesse individuo a capacidade de suportar certas crises e de
superá-las. A sociologia vai fazer referência à influência do entorno, da
cultura, das tradições como construtores dessa capacidade do individuo de
suplantar as adversidades. A teologia traz um aporte diferente pela própria
subjetividade transcendente, uma visão outra da condição humana e da necessidade
do sofrimento como fator de evolução espiritual: o célebre “dar a outra face”.
Mas foi o cotidiano das pessoas
que passam por traumas, que realmente atravessam o vale das sombras, o que
realmente atraiu a curiosidade de cientistas do mundo inteiro. Não são
personagens de ficção que se erguem após a grande queda; são homens, mulheres,
crianças, velhos, o individuo comum do mundo que retoma sua vida após a morte
de um filho, a perda de uma parte de seu corpo, a perda do emprego, doenças
graves, físicas ou psíquicas, em si mesmo ou em alguém da família, razões
suficientes para levar um individuo ao caos. Esses que são capazes de continuar
uma vida de qualidade, sem auto-punições, sem resignação destruidora, que
renascem dos escombros, esses são seres resilientes.
A resiliência é um termo oriundo
da física. Trata-se da capacidade dos materiais de resistirem aos choques. Esse
termo passou por um deslizamento em direção às ciências humanas e hoje
representa a capacidade de um ser humano de sobreviver a um trauma, a
resistência do individuo face às adversidades, não somente guiada por uma
resistência física, mas pela visão positiva de reconstruir sua vida, a despeito
de um entorno negativo, do estresse, das contrições sociais, que influenciam
negativamente para seu retorno à vida. Assim, um dos fatores de resiliência é a
capacidade do individuo de garantir sua integridade, mesmo nos momentos mais
críticos.
Não se é resiliente sozinho,
embora a resiliência seja íntima e pessoal. Um dos fatores de maior importância
é o apoio e o acolhimento, feito em geral por um outro individuo, e essencial
para o salto qualitativo que se dá. Alguns autores nomearam essas pessoas:
Flash chamou-o mentor de resiliência; Cyrulnik chamou-o tutor de resiliência;
muito antes Bolwby chamou-o figura de apego. Denominações a parte, a
resiliência ganha hoje seu espaço na pesquisa em ciências humanas, médicas,
sociais, administrativas etc.
Mas não se forma um
mentor/tutor/figura de apego. Não se pode dizer que alguém vai ser a partir de
agora esse individuo que vai chegar para operar o milagre. A resiliência é, na
verdade, o resultado de intervenções de apoio, de otimismo, de dedicação e
amor, idéias e conceitos que entram sorrateiramente nas ciências como causa e
efeito, intervenção e resultado, hipótese e tese de que as relações intra e
interhumanas são relações que ultrapassam o rigor do empirismo para encontrar o
acaso.