APLICAÇÃO
DE FONTES RADIOATIVAS EM PESQUISA, NO DIAGNÓSTICO E NO TRATAMENTO DE DOENÇAS: USO DE
FONTES DE RADIAÇÃO NA PESQUISA E NO DESENVOLVIMENTO DE TECNOLOGIA PARA
POTENCIAL APLICAÇÃO NO DIAGNÓSTICO DE DOENÇAS E A IMPORTÂNCIA DA RADIOFARMÁCIA
Mario Bernardo-Filho (1,2,3),
Luciana Camargo Bernardo (1,3), Lavínia
Brito (1,3) e Sebastião David dos Santos-Filho (1,3)
1-Universidade
do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Biologia Roberto Alcantara Gomes,
Departamento de Biofísica e Biometria, Rio de Janeiro, RJ, 20551-030.
2-
Instituto Nacional do Câncer, Coordenadoria de Pesquisa, Rio de Janeiro, RJ,
20230-130
3-
Sociedade Brasileira de Biociências Nucleares – SBBN (www.sbbn.com.br)
E.mail: bernardo@uerj.br
Os isótopos
radioativos (radionuclídeos) têm grande importância nos procedimentos de
medicina nuclear. Os radionuclídeos foram descobertos no final de século XIX,
mais precisamente no ano de 1896 por Henry Bequerel. Bequerel observou que sais
de urânio à semelhança dos raios X, que haviam sido descoberto por Wilhelm
Conrad Roentgen em 1895, emitiam radiações que eram capazes de promover a
ionização de gases e de impressionar chapas fotográficas. Os radionuclídeos são
empregados em ciências biomédicas como fontes de radiação ou como traçadores
radioativos. Quando empregados como fonte de radiação podem ser como fontes
seladas ou não seladas. Nas fontes seladas, o isótopo radioativo está contido
em um recipiente fechado e não existe contato direto do referido isótopo com o
organismo a ser irradiado, não havendo possibilidade, em condições normais, de
contaminação radioativa. Essas fontes são utilizadas em Radioterapia através
da: (i) teleterapia, quando a fonte está a uma distância importante do alvo a
ser irradiado e (ii) braquiterapia, quando existe um contato íntimo entre o
recipiente que contém a fonte e o organismo a ser irradiado. As fontes não
seladas quando são empregadas, seja em pesquisa, seja na rotina clínica são
comumente referidas como traçadores radioativos. Quando esses radioatraçadores
apresentam características farmacológicas, como apirogenicidade, atoxidade e
esterilidade são denominadas de radiofármacos e são empregadas para diagnóstico
e terapia de doenças. Esse termo (radiofármaco), de modo geral, não corresponde
a um termo que caracterize bem o que representa. O citado radiotraçador não
apresenta atividade farmacológica como a palavra radiofármaco pode sugerir,
além disso, pode corresponder a uma estrutura de natureza molecular, assim
como, celular a qual está ligado um determinado radionuclídeo. Assim, é
apresentado como sugestão o termo radiobiocomplexo em substituição ao
radiofármaco. No caso dessas fontes não seladas ocorre o contato total do
radionuclídeo com as estruturas biológicas, que passam a conter a amostra
radioativa. O uso dessas fontes está restrito aos laboratórios dos serviços de
medicina nuclear e radiofarmácia, assim como de pesquisa nos quais os
profissionais que nele trabalham, possuem experiência e qualificação para
manipulação dessas fontes, sendo devidamente credenciados pela Comissão
Nacional de Energia Nuclear. Em um serviço de medicina nuclear, encontram-se os
profissionais estão envolvidos com o diagnóstico clínico, os médicos, e os
radiofarmacêuticos. No Brasil, os radiofarmacêuticos têm sido representados por
profissionais de formações acadêmicas diversas, como biólogo, químico,
biomédico, farmacêutico e outros que ficam com a responsabilidade do preparo e
dos diversos controles de qualidade dos radiobiocomplexos. Além desses
profissionais, o físico também fica encarregado pelos cuidados relativos à
radioproteção, contaminação e a dosimetria dos procedimentos. Em um laboratório
de pesquisa, esses profissionais e outros, assim como estudantes com interesse
no desenvolvimento de tecnologia visando a aplicação de fontes não seladas
trabalham integrados. Essas pessoas estão vinculadas diretamente a uma
Instituição, ou estão realizando qualificação em programas de iniciação
científica e pós-graduação. Inúmeros radionuclídeos são utilizados
rotineiramente em todos os serviços de medicina nuclear, sendo que o critério
de escolha depende do procedimento clínico a ser executado, visando o
diagnóstico e/ou terapia de doenças. De acordo com o procedimento, a seleção do
isótopo radioativo depende de suas características físicas, como o tipo de
emissão radioativa, a meia-vida e a energia da radiação emitida. Como definido anteriormente, os
radiobiocomplexos são submetidos a controles de qualidade que permitem que os
mesmos possam ser administrados a seres humanos nos procedimentos de medicina
nuclear. Diversas especialidades médicas beneficiam-se desses exames, como a
gastroenterologia, a endocrinologia, a pneumologia, a pediatria, a urologia e a
nefrologia. Na oncologia, a medicina nuclear tem um destaque, tanto em nível de
diagnóstico quanto de terapia de tumores, servindo também para acompanhar com
segurança a eficácia de tratamentos. A imagem cintilográfica oferece
informações sobre a fisiopatologia dos órgãos, sendo definida como imagem
metabólica. Os radionuclídeos empregados em tratamento em medicina nuclear
deverão ser preferencialmente emissores de radiação beta negativa, uma vez que,
a transferência linear de energia (LET) dessas radiações é elevada. Como
exemplos podemos citar (i) o iodo-131, na forma de iodeto de sódio ou ligado a
molécula de metaiodobenzilguanidina, (ii) o samário-153, marcando o ácido
etilenodiaminotetrametilenofôsfonico (EDTMP), (iii) o fósforo-32, como
dicromato de fósforo ou fosfato de sódio, (iv) o rênio-186, marcando o
hidroxietilidenodifosfonato (HEDP) e (v) ítrio-90 como citrato. Além desses,
tem-se o estanho-117m, que ao contrário dos citados, desintegra-se por isomeria
nuclear, emitindo radiação gama. Esse isótopo radioativo, aparentemente sem
importância em radioterapia devido à emissão gama, pode, por conversão interna
levar a ejeção de um elétron da coroa eletrônica, elétron de conversão interna
(ECI), que por sua vez, pode determinar a emissão de outro elétron, o elétron
Auger (EA). Os ECI e os EA seriam então responsáveis pela dose de radiação
depositada no local a ser irradiado. Os
ECI e EA têm propriedades físicas similares às radiações beta negativa, com
grande poder de interação com a matéria e concomitantemente alto LET, o que
credencia os radionuclídeos que realizam o fenômeno de conversão interna para
também serem usados em radioterapia. Os radionuclídeos usados em diagnóstico em
medicina nuclear deverão ser emissores de radiação gama ou raios X
característicos uma vez que essas radiações apresentam baixo LET e são
facilmente detectadas externamente ao corpo humano quando ocorre a
administração do radiobiocomplexo. Preferencialmente são usados os isômeros
nucleares e os radionuclídeos que realizam o fenômeno de captura eletrônica
(captura K). Desse modo, os radiofármacos marcados com tecnécio-99m (99mTc),
iodo-123, índio-111, gálio-67 e tálio-201, como citado anteriormente, estão de
forma relevante presentes na prática médica em procedimento conhecido por
cintilografia (single photon emission computed
tomography - SPECT). Emissores de radiação beta positiva também podem ser
usados para diagnóstico através da Positron
emission tomography (PET). A imagem
PET é obtida devido ao processo de aniquilamento da matéria que ocorre com a
radiação beta positiva. Destaca-se no PET o uso flúor-18 marcando a
desoxiglicose para estudos de alteração de metabolismo, como em oncologia. Na
década de 60 do século passado, os isótopos radioativos de iodo predominavam
nos exames de diagnóstico, enquanto que a partir dos anos 70, o 99mTc passou a
ocupar lugar de destaque nos exames de medicina nuclear. Em pesquisa, vários
modelos experimentais baseados na alteração da marcação de elementos sanguíneos
com 99mTc e na modificação da biodisponibilidade de radiobiocomplexos marcados
com 99mTc têm possibilitado a aquisição de importantes informações sobre o
efeito de produtos naturais e sintéticos. As diversas investigações científicas
envolvendo a obtenção e utilização de radiobiocomplexos marcados com 99mTc
proporcionam o desenvolvimento de tecnologia e de modelos experimentais.
Estudos foram realizados em nosso laboratório, avaliando o efeito de extratos
de plantas medicinais e de drogas na marcação de elementos sangüíneos com 99mTc
e na biodisponibilidade do radiofármaco pertecnetato de sódio (99mTcO4Na)
em ratos Wistar. Estudos realizados com café (Coffea arábica), Ginkgo biloba, chuchu (Sechium edule), espinheira santa (Maytenus ilicifolia), ginkgo biloba, guaraná (Paullinia cupana), menta (Mentha
crispa), cáscara sagrada (Rammus
purshiana), cambará (Lantana câmara),
sabugueiro (Sambucus australis) e
erva de São João (Hypericum perforatum)
demonstraram alteração na marcação de elementos sangüíneos com 99mTc, sendo que
o boldo (Peumus boldus) e couve-flor
(Brassica oleracea) não alteraram a
marcação. Estudos de biodisponibilidade do pertecnetato de sódio em ratos
Wistar foram realizados e o chuchu, a menta e a erva de São João foram alguns
dos extratos que alteraram a captação desse radiobiocomplexo pelos órgãos,
sendo que a couve-flor não produziu alteração. A aquisição de informações sobre
o efeito de produtos naturais e sintéticos é de grande relevância para a
utilização de radiobiocomplexos em medicina nuclear evitando assim o falso
diagnóstico e/ou a repetição do exame.
6- Bibliografia
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Apoio financeiro: FAPERJ, CNPq e
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