AVANÇOS BRASILEIROS EM NANOTECNOLOGIAS

 

Antonio Gomes de Souza Filho

Departamento de Física – Universidade Federal do Ceará

e-mail: agsf@fisica.ufc.br; http: //www.fisica.ufc.br/agsf

 

Introdução: O binômio nanociência/nanotecnologia é atualmente um dos temas (senão o mais) mais debatidos pela comunidade científica e tecnológica. A explosão dessa fronteira da ciência é devido ao fato de que diariamente são descobertos novos fenômenos em nanoescala, sendo esses promissores para aplicações em uma nova geração de dispositivos que irão revolucionar a vida da sociedade. O caráter multidisciplinar do tema contribui de forma muito significativa para revelar esse novo horizonte da ciência. Além disso, a nanotecnologia começa a cumprir suas promessas com produtos sendo disponibilizados para as pessoas. Esse processo alimenta ainda mais o interesse, o número de pessoas, e os investimentos nessa área de pesquisa cujo alvo é um mercado com muitas cifras. As previsões de mercado para a área de nanotecnologia ligada às ciências da vida. A perspectiva é sair de um mercado de 910 milhões de dólares em 2005 para 3,4 bilhões em 2010 segundo a Bussiness Communication Company Inc. Os governos e empresas do mundo inteiro apostam milhões de dólares acreditando no potencial dessas novas tecnologias. Muitos países de primeiro mundo já tratam o domínio da nanotecnologia como condição primordial para manter a supremacia econômica nos próximos anos.

Realidade Brasileira: As ações do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), tais como o Programa Plurianual de Nanotecnologia, que reservou R$ 77,7 milhões para o orçamento 2004/2007, além do lançamento de editais destinados a jovens pesquisadores para financiamento de projetos na área de nanociência/nanotecnologia nos colocam diante de um cenário muito otimista. Os órgãos de fomento à pesquisa, na medida do possível devido à condição de nossa economia, estão fazendo sua parte ao adotar uma posição favorável para o desenvolvimento de nanotecnologias em nível nacional. O incentivo à criação de redes cooperativas de pesquisa e inovação e o apoio a jovens pesquisadores são ações que merecem destaques. A nanociência e a nanotecnologia têm como base dois conceitos que são chamados de top-down (de cima para baixo) e bottom-up (de baixo para cima). A primeira abordagem consiste em miniaturizar para a escala nano a partir da escala micro. Esse tipo de abordagem exige domínio tecnológico de toda tecnologia da microeletrônica implicando em um grande volume de recursos e mão de obra muito qualificada. A segunda abordagem é mais simples e exige uma quantidade de recursos bem menor do que a primeira sendo a criatividade do cientista o ingrediente fundamental. Nesse caso os sistemas nanoestruturados são formados a partir de átomos e moléculas e podem ser “montados” através da manipulação de átomos ou pelos processos do tipo self-assembly (auto-montagem). Do ponto de vista tecnológico para a produção em massa somente o processo de automontagem é viável. Nosso ponto de vista é que o Brasil tem chances de desenvolver nanotecnologia usando a abordagem bottom-up explorando os processos de auto-montagem. A criatividade é o recurso mais importante nesse tipo de abordagem e produtos de nanotecnologia podem ser criados sem investimentos de larga escala e estes retornam rapidamente para a sociedade através de royalties pagos pelas empresas que compram essa tecnologia. Alguns grupos no Brasil vivem a realidade de terem seus laboratórios parcialmente financiados pelos recursos gerados pelo desenvolvimento de nanotecnologia.

O Brasil tem contribuído de forma bastante significativa com a produção científica no tema nanociência. Pesquisas realizadas por grupos brasileiros estão cada vez mais presentes nas páginas das revistas mais prestigiadas das diversas áreas do conhecimento caracterizando um enorme avanço do país na geração de conhecimento básico. Exemplificando, podemos citar as pesquisas realizadas no Brasil em nanotubos de carbono, um material modelo para discutir os conceitos da nanociência. Vários grupos teóricos e experimentais (incluindo o nosso) têm realizado trabalhos nesse tema com grande impacto na comunidade científica internacional. O que se espera agora é que essas pesquisas comecem a contribuir de forma decisiva para a resolução de problemas em diferentes áreas, como armazenamento e produção de energia, agricultura, doenças, alimentos e poluição. Um país que tem o agronegócio como a atividade mais importante para o equilíbrio da balança comercial, os pesquisadores devem aproveitar a excelência adquirida nesse campo de pesquisa e agregar cada vez mais valores através das nanotecnologias.Uma das áreas mais promissoras da nanotecnologia é combinar as propriedades peculiares dos nanomateriais com as propriedades de reconhecimento molecular das moléculas biológicas. O Brasil tem excelência em genômica e diversos grupos estão consolidados na síntese e preparação de diferentes nanomateriais. A confluência dessas duas competências poderá dotar o País com uma bagagem tecnológica de altíssimo valor agregado no agronegócio. A riqueza da biota Brasileira explorada no escopo da química supramolecular e da nanociência voltada para resolver problemas nacionais é um tema que merece atenção especial. Atrelados a esse nicho estão os ricos mercados dos fármacos, dos pigmentos e dos cosméticos.

Avanços Brasileiros em Nanotecnologia: A realização da feira de nanotecnologia em São Paulo (NANOTEC 2005) mostra que as empresas já reconhecem e estão otimistas quanto ao desenvolvimento da nanotecnologia no Brasil. Já podemos listar os avanços que o país tem realizado nessa área. Trata-se não apenas de produtos desenvolvidos, mas de uma série de resultados promissores e inovadores em diversas áreas da tecnologia. Podemos apontar que uma das áreas mais promissoras é a administração seletiva e liberação controlada de drogas no corpo humano. No Brasil, as nanotecnologias começam a cumprir suas promessas. Recentemente, um grupo da Universidade de Campinas (Unicamp) conseguiu usar sistema nanométricos para levar até células cancerosas uma droga chamada violaceína (para maiores detalhes ver http: //www.unicamp.br/unicamp/divulgacao/BDND/ND_662/ND_662.html). Essa droga é insolúvel em água e os solventes utilizados na administração dessa droga são tóxicos para o ser humano deixando o paciente com uma série de efeitos colaterais indesejáveis. Esse tipo de produto demora a chegar às pessoas devido a uma longa etapa para testes e aprovação pelos órgãos competentes, mas certamente tratar-se-á de um grande avanço no tratamento de câncer baseado em nanotecnologia. Outro trabalho, realizado no Brasil, e que merece destaque trata-se do uso de nanocápsulas para a terapia de doenças relacionadas ao vítreo do olho humano. Pesquisadores da UNESP-São Paulo desenvolveram sistemas para a liberação controlada de drogas (Triancinolona, Vancomicina, Ciprofloxacino) no vítreo do olho usando nanocápsulas (Revista Pharmacia Brasileira Ano IX, Número 47, Página 10, Março 2005). Essa abordagem representa um grande avanço na área de tratamento de patologias associadas ao vítreo. A administração de drogas pelos métodos tradicionais é muito ineficaz, pois é extremamente difícil o medicamento atingirem a parte posterior do olho. No caso da terapia usando medicamentos injetáveis no vítreo é um procedimento extremamente doloroso para o paciente. Os resultados também não são satisfatórios além do que esse tipo de terapia pode trazer danos irreversíveis ao olho do paciente. Comparado com os sistemas disponíveis no mercado, o trabalho dos pesquisadores da UNESP permitiu um grande avanço, pois conseguiram produzir nanocápsulas menores e com o tempo de liberação cinco vezes maior do que os convencionais. Usando essa nova tecnologia os pesquisadores podem programar o tempo de duração da liberação da droga. Esse dois exemplos que citamos acima ilustram bem o potencial da comunidade científica Brasileira no quesito inovação. Isso nos colocam num cenário bastante otimista e sugere que a comunidade científica se aproxime cada vez mais dos agentes empresariais nacionais para que possamos proteger o conhecimento gerado nos laboratórios das instituições públicas através do desenvolvimento de produtos. Esse processo gera emprego e melhora as condições de vida da sociedade que financia as pesquisas. Talvez tenhamos nesse momento uma chance ímpar de fazer com que a nossa capacidade científica em nanociência não tenha como destino final apenas a publicação de artigos, mas que parte dela gere riqueza nacional. Essa mudança de paradigma em algumas áreas da ciência Brasileira passa pela reformulação de algumas grades curriculares e pela postura tradicional de parte da comunidade científica. Fazer ciência buscando aplicações tem de ser valorizada tanto quanto fazer pesquisa básica. É claro que a âncora de ambas deve ser a qualidade.

 

O autor agradece as Agências Brasileiras de Fomento CAPES, CNPq e FUNCAP-CE pelo financiamento dos projetos de pesquisa em Nanociências.