ESTUDO QUÍMICO E RESULTADOS FARMACOLÓGICOS DE PLANTAS DO PANTANAL E DO ENTORNO

 

Paulo Teixeira de Sousa Jr (*)

 

O Laboratório de Pesquisas em Química de Produtos Naturais da UFMT (LPQPN) iniciou suas atividades em 1994, visando contribuir para o estudo da flora medicinal mato-grossense.  As espécies estudadas foram selecionadas com base em informações populares, no perfil químico das famílias ou pela combinação destes dois critérios.  Das mais de 40 espécies submetidas à triagem químico-farmacológica até o presente, três apresentaram-se bastante promissoras, a saber: Callophylum brasiliense (Camb.) – Clusiaceae;  Spiranthera odoratissima St. Hill – Rutaceae e Acosmium dasycarpum Vog. (Yakovlev) - Fabaceae. Extratos obtidos a partir de tais espécies foram submetidos a diversos ensaios farmacológicos, tendo sido fracionados por técnicas cromatográficas convencionais (cromatografias em coluna, radial prepartiva, de média pressão e de alta eficiência), sendo que as substâncias isoladas foram identiticadas por técnicas espectroscópicas usuais (IV, UV, RMN 1H e 13C, EM, difração de raios-X).

Empregada popularmente para o combate a úlceras e inflamações, através da ingestão de chás preparados a partir da casca do caule, C. brasiliense é conhecida em Mato Grosso como guanandi ou jacareúba.  Ensaios farmacológicos in vivo realizados no Laboratório de Farmacologia de Produtos Naturais da UFMT (LFPN) demosntraram ação anti-úlcera no extrato hexânico e fração de diclorometano (DCM2) das cascas do caule desta especie, sendo que ambos (extrato e fração) não apresentaram toxidez.  A análise química por via úmida, efetuada na fração DCM2 evidenciou a presença de xantonas, taninos, triterpenóides, compostos fenólicos, esteróides, cumarinas e ácidos fixos.  O fracionamento deste material levou ao isolamento de terpenóides de ampla ocorrência, além  das cromanonas ácido brasiliênsico, isobrasiliênsico e inofilóidico, isoladas na forma de seus metoxi-metil ésteres mais estáveis.

Conhecida localmente como manacá, S. odoratissima vem sendo empregada popularmente no tratamento de sífilis, infecção dos rins, abcesso e reumatismo, através da ingestão do decocto (em vinho ou aguardente) preparado a partir de suas raízes e folhas.  Ensaios farmacológicos in vitro para determinar a atividade antioxidante (DPPH e xantina oxidase), realizados no LPQPN, e in vivo para determinar a possível atividade anti-inflamatória (realizados no LFPN) levaram a resultados negativos, para os extratos metanólicos (EMeOH) e de diclorometano (EDCM) das raízes desta espécie. Não foi confirmado, desta forma, o uso popular. Ensaios de citotoxidade (Artemia salina) e de união ao DNA, entretanto, realizados nos EMeOH e EDCM apresentaram resultados animadores. Após fracionamento do EBDCM obteve-se os alcalóides furoquinolínicos g-fagarina, dictamina e esquimianina, além do esteróide b-sitosterol, da cumarina aurapteno, que apresentou bons resultados nos ensaios de união ao DNA,  e dos limonóides limonina e odoratina, este último ainda inédito na literatura. Do EMeOH isolou-se os alcalóides indolopiridoquinazolínicos rutaecarpina, evodiamina e 1-hidroxirutaecarpina, além de mais um limonóide inédito o qual denominamos odoratinina.

A. dasycarpum é predominante no cerrado brasileiro e conhecida pela população local como perobinha, chapada, pau-paratudo ou unha d´anta. Na medicina popular, o chá das cascas das suas raízes e do caule é empregado no combate a inflamações, afecções cutâneas, distúrbios do sistema nervoso central e cárdio-vascular. A literatura relata que o extrato bruto etanólico e frações alcaloídicas oriundos das cascas do caule desta espécie possuem atividade depressora do sistema nervoso central e de contração da musculatura lisa, cardíaca e esquelética. Na análise química por via úmida das cascas das raízes, realizada no LPQPN, foi evidenciada a presença de alcalóides, catequinas, esteróides, triterpenos, flavonóis, flavanonas, flavononóis e saponinas. Durante o processo de desengorduramento deste material isolou-se o lupeol, e do fracionamento cromatográfico do extrato bruto metanólico (EBMeOH) obteve-se a  4-metoxi-6- (p-hidroxiestiril)-a-pirona além dos alcalóides lupanina, (+)-homo-6-epipodopetalina, acosminina, acosmina e panacosmina. Foram também obtidos os alcalóides lupanacosmina e dasicarpumina, inéditos na literatura. A avaliação de atividade antiinflamatória,  realizada no EBMeOH, através do ensaio de edema de pata induzido por carragenina,  apresentou bons resultados. Adicionalmente, a 4-metoxi-6- (p-hidroxiestiril)-a-pirona  apresentou atividade antimicrobiana no ensaio por difusão em meio sólido contra a cepa bacteriana Staphylococcus epidermidis (ATCC-12.228) e fúngica Trichophyton mentagnophytes (LM-298).  Estes resultados, em princípio, corroboram o uso popular de  A. dasycarpum  nas afecções cutâneas e como antiinflamatório.

 

 

 

 

(*) Laboratório de Pesquisas em Química de Produtos Naturais (LPQPN), Departamento de Química – ICET; Universidade Federal de Mato Grosso (teixeira@cpd.ufmt.br).

 


Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004