OBSERVATÓRIO DE VIOLÊNCIA NAS ESCOLAS - BRASIL

 

Marlene Monteiro Pereira (*)

 

As violências nas escolas são um tema que costuma ter repercussão e atrair a atenção do grande público. Todas as vezes que acontece algo de trágico dentro ou nos arredores das escolas – como quando alguém entra armado na escola, quando um aluno é ferido ou mesmo assassinado e um professor é agredido – o assunto se torna alvo de interesse de mídia, ganha as páginas de jornal, o noticiário da TV, criando a impressão de que o caos reina nas nossas escolas.

No entanto, é preciso perceber algumas coisas para que nós não fiquemos na superficialidade das notícias. Mesmo porque o assunto é grave, complexo e envolve uma série de aspectos, sem falar os prejuízos para a qualidade de ensino e para a aprendizagem dos alunos.

Um primeiro ponto a ser ressaltado é que a violência nas escolas não está restrita a um ou outro estabelecimento, muito menos ao Brasil. Há vários anos, em diversos países do mundo, há pesquisadores e educadores se dedicando a analisar e compreender o fenômeno na busca de alternativas e soluções. O segundo ponto é o fato de que, da mesma maneira que a escola é um campo onde as violências se manifestam e podem ser construídas (por meio de mecanismos próprios da instituição escolar), a escola também pode ser um espaço de desconstrução da violência, um campo onde se desenvolvem ações e projetos que melhoram as relações interpessoais e o clima escolar, com reflexos positivos na formação dos alunos.

É tendo em vista essas duas premissas que foi criado o Observatório de Violências nas Escolas-Brasil. O Observatório foi fundado em novembro de 2002, a partir de parceria entre a Universidade Católica de Brasília e a UNESCO, num contexto em que as atenções da opinião pública começaram a se voltar para o problema devido à visibilidade conquistada pelo tema, sobretudo na mídia.

 

Mas, o que é um observatório? De uma maneira geral, um observatório é um núcleo que normalmente reúne pesquisadores e especialistas numa determinada temática com a finalidade de identificar e analisar realidades, contextos, fatos e processos.

A estrutura e a proposta do Observatório brasileiro foram inspiradas na experiência européia onde, desde 1998, existe o Observatório Europeu da Violência Escolar. Este observatório consiste em uma rede formada por pesquisadores ligados a diversas universidades européias e de outras regiões do mundo. No plano internacional, podemos citar ainda o Observatório Internacional da Violência Escolar, que reúne países de diversas regiões do mundo. O Observatório brasileiro está ligado a ambos, integrando uma rede internacional de pesquisas e ação sobre a temática.

No caso do Observatório de Violências nas Escolas-Brasil, a missão é realizar pesquisas sobre as violências na escola, oferecer cursos e propor recomendações às políticas públicas, incentivando o desenvolvimento de estratégias de prevenção e superação do problema. A idéia é que o Observatório seja um espaço de encontro e articulação entre pesquisadores, educadores, gestores e demais profissionais interessados na compreensão e análise da violência escolar, bem como na elaboração de projetos coletivos baseados em diagnóstico da situação das escolas.

Essas propostas se tornam viáveis na medida que o Observatório une a expertise da Universidade Católica de Brasília e da UNESCO. A primeira possui uma ampla experiência em ensino, pesquisa e extensão, que remonta à década de 70, com uma história de formação de educadores para o Distrito Federal e entorno. Já a UNESCO aporta a experiência sinérgica em pesquisas e projetos de ação direta no campo, bem como na formulação de propostas para políticas públicas. Um exemplo é o programa Abrindo Espaços, que visa estimular a integração entre escola e comunidade por meio da abertura dos estabelecimentos educacionais nos fins de semana, com atividades de esporte, cultura e lazer. O outro é a parceria entre a UNESCO e o MEC, visando a implantação de um plano nacional de enfrentamento da violência escolar, anunciado semana passada.

Atualmente, o Observatório já conta com uma equipe de pesquisadores e vem realizando algumas atividades, tais como um curso de extensão sobre “Direitos Humanos e Juventudes”, para policiais militares do Distrito Federal e o Congresso Ibero-Americano sobre Violências nas Escolas, realizado na semana passada em Brasília e que reuniu cerca de 600 pessoas de diversas partes da América Latina e Europa e Canadá. Vale ressaltar que, além dos estudos e experiências apresentadas, o Congresso resultou numa documento  que estabelece algumas diretrizes para  a superação problemas, a “Carta de Brasília por uma Escola sem Violência”.

O Observatório também está desenvolvendo um trabalho interno na Universidade Católica de Brasília, a fim de mobilizar estudantes, especialmente da área da Educação, a fim levar a discussão sobre o tema aos alunos de graduação, os quais serão os futuros profissionais que atuarão nas escolas, nas secretarias de educação, etc.

Finalmente, vale destacar que a equipe do Observatório está trabalhando no desenvolvimento de projetos de diagnósticos sobre a violência escolar, a partir de instrumentos testados e avaliados, a fim de conhecer o que acontece nas escolas e, a partir disso, desenvolver ações de enfrentamento adequadas à realidade de cada estabelecimento educacional. Afinal, é fundamental considerar que cada escola é um mundo em si e que a teia de relações que se dá em cada uma delas pode favorecer ou evitar as manifestações de violência.

É importante esclarecer que a estrutura e a propostas do Observatório não só prevê, como possibilita, o trabalho em parcerias e em rede. Atualmente, já existem dois núcleos de pesquisadores ligados ao Observatório que pertencem à Universidade da Amazônia (UNAMA, do Pará) e a Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UNIRIO).

Ambos os núcleos vêm realizando estudos e atividades nas linhas descritas anteriormente e vêm mantendo intercâmbio com o núcleo central, localizado em Brasília. A nossa intenção é ampliar esta rede, incorporando pesquisadores de outras universidades, construindo uma rede nacional de estudo e enfrentamento da violência escolar.

As pesquisas mostram que a questão das violências existe e que tem  impacto sobre a aprendizagem e o funcionamento da escola. No entanto, uma série de experiências e ações – algumas divulgadas no Congresso Ibero-Americano, outras documentadas em livros da UNESCO e até os resultados do programa Abrindo Espaços – demonstra que há solução para o problema da violência nas escolas..

Assim sendo, nossa tarefa é apoiar essas iniciativas, unindo esforços e trocando experiências. Isso significa também transformar o assunto em um alvo prioritário das políticas públicas em todos os níveis governamentais e que eles atuem em regime de colaboração.

Desse modo, acreditamos que é possível modificar o atual quadro de degradação das relações, do clima e das violências em certos estabelecimentos educacionais, de modo que escola possa cumprir plenamente o papel social que lhe é destinado, formar crianças e jovens, garantindo a eles uma educação de qualidade.

 

(*) Professora da Universidade Católica de Brasília e Participante do Observatório de Violências nas Escolas-Brasil

 


Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004