O LUGAR DA LINGÜÍSTICA NO SUL: PROJEÇÕES PARA UMA

POLÍTICA CIENTÍFICA DA ÁREA

 

Amanda Eloina Scherer (Laboratório CORPUS/PPGLETRAS/UFSM)

 

No atual modelo universitário, em que se presenciam demonstrações de ansiedade em demarcar territórios, em legitimar discursos, para poder com mais clareza excluir o que está fora das fronteiras demarcadas e dos discursos legitimados, as teorias podem pretender ser disciplinas em que se questionem as próprias fronteiras com que se delimitaram as áreas acadêmicas, ajudando a minar as possíveis pretensões de controle monopolista – de outras cadeiras, departamentos  e cursos – sobre os conteúdos.

Nas universidades brasileiras, em geral,  segue-se uma divisão em departamentos que, mais do que uma solução administrativa, obedece a um conjuntos de disciplinas que cobrem determinados campos do saber. Por extensão, a distribuição dos professores é feita de acordo com as disciplinas que lhes são atribuídas, aquelas nas quais são considerados – e consideram-se – especialistas.

Demarcados os territórios e definidos os agentes – no caso os professores – chega-se à outra ponta do processo, o do ensino e do pesquisa. A compreensão dessa representação nos permite analisar o papel dos formadores do processo de institucionalização destes ditos territórios tal como se estão postos na universidade brasileira.

Em nosso caso, os estudos da linguagem, que compõem o eixo central dos Cursos de Letras no Brasil, a demarcação de territórios origina-se a partir de aspectos culturais e de concepções epistemológicas bem definidas.

A Lingüística, por exemplo, tal como está definida e reconhecida a partir dos postulados do estruturalismo novecentista, de reconhecimento mais recente, possui posição privilegiada como fornecedora do suporte teórico-metodológico que serve às disciplinas que trabalham com a linguagem no sentido em geral e com a descrição das línguas de modo mais especifico. No entanto, a história do pensamento lingüístico normalmente é concebida como consistindo de períodos com rupturas mais ou menos bem definidas, segundo Schlieben-Lange (2000).

Interessa-nos, portanto, a indagação sobre essa formação na rede universitária do Rio Grande do Sul. E nesse âmbito surgem muitas perguntas que permanecem fundadoras para a compreensão desse processo e propícias para se traçar uma política científica da área. Em que contexto se dá a gênese da institucionalização desses estudos? Que critérios foram utilizados para se dividir a área de Letras em disciplinas? Que ponto de vista cultural presidiu a criação delas? Que tipo de discurso sobre o lingüístico essas disciplinas produzem? Que tipo de esclarecimento a análise crítica delas pode produzir? O que é cientifico, ciência e por conseguinte pesquisa para esses atores e, por conseguinte, para a área de Lingüística?

Por outro lado, se nossa visão de lingüística e de língua não pode deixar de ser uma configuração enraizada em nossa própria autoconsciência social, ao corporificarmos essa visão em discurso, tornamo-la acessível mesmo aos que dela não compartilham e, ao mesmo tempo, possibilitamos sua problematização para os que a adotam, pois podem vê-la, não apenas de dentro do contínuo fluxo de suas experiências pessoais, mas como uma construção discursiva diante de cujo significado podem posicionar-se.

A discussão que estamos propondo desse tema está relacionado com a política coordenada pela SBPC, que se articula com todas as áreas de ciência e tecnologia do Brasil. Tal comunicação pretende discurtir o fato de a área de Lingüística não constar do Livro Verde da SBPC, propondo subsídios para inserção da área nas próximas políticas para a ciência que vêm sendo articuladas dentro da SBPC.

Além do mais, o atual governo, com a reativação do Conselho de Ciência e Tecnologia, vem solicitando das áreas uma maior precisão das suas demandas e uma maior responsabilidade em relação aos focos prioritários sobre os quais se devem debruçar as pesquisas no País. Tal é a nossa preocupação ao reexaminar o Perfil da área de Letras e Lingüística no sul do pais. Desse modo, buscamos apontar o status quo da ciência na área da Lingüística, mostrando o seu direcionamento para a próxima década.

Podemos afirmar que o nosso objetivo é a procura de uma cultura de experiência em ciência e tecnologia, que possa implementar novos parâmetros para organizar o social-acadêmico, a fim de subsidiar  formulações de políticas de recursos humanos, de organização curricular e da própria pesquisa, em que essas, na sua discursividade, estejam marcadas pelo tempo e lugar ocupados pelo sujeito. Tal procura, por sua vez, tem seu espaço e  seu lugar entre o passado e o futuro, enquanto prática social, construída na dominação desses dois modos de existência pela experiência do presente.

Nós nos interessamos, também, pela orientação no campo em que a linguagem é tomada como prática, mediação, trabalho simbólico  (ORLANDI, 1996). Desse modo, sujeito e sentido, na pesquisa, não podem ser tratados como já existentes em si, como a priori.

 


Anais da 56ª Reunião Anual da SBPC - Cuiabá, MT - Julho/2004