64ª Reunião Anual da SBPC
G. Ciências Humanas - 1. Antropologia - 4. Antropologia Rural
ÂNCORAS IDENTITÁRIAS EM COMUNIDADES RIBEIRINHAS DE MATO GROSSO
Elizete Pereira da Costa 1
Marli Carneiro Fernandes 1
Micnéias Tatiana de Souza Lacerda Botelho 2
Vanubia Sampaio dos Santos 2
Darci Secchi 3
1. Instituto de Educação - UFMT
2. Programa de Pós-Graduação em Educação, Instituto de Educação - UFMT
3. Prof. Dr./ Orientador - Instituto de Educação - UFMT
INTRODUÇÃO:
Em um passado muito recente, prevalecia no Brasil, a ideia de que as comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas, etc. eram grupos remanescentes de um inexorável processo de assimilação pela “sociedade nacional”. Sob tal perspectiva, as formas de organização social, linguística, espacial, religiosa, etc. eram percebidas como a cristalização de um padrão de comportamento arcaico, arredio ao desenvolvimento e fadado ao isolamento e à extinção. As pesquisas, de modo geral, pretendiam conhecer e registrar essas “culturas tradicionais” e suas especificidades antes que desaparecessem. Os anos passaram e esse diagnóstico fatalista não se concretizou. Ao contrário, diversas comunidades ditas “tradicionais” se mantiveram vivas, outras ressurgiram e se consolidaram como um modo de vida e de organização social plenamente viável no contexto da modernidade, globalização e padronização cultural. As suas tradições históricas estão sendo revistas, politizadas e exercidas como princípios geradores de identidades, seja de natureza étnica (índios), de cor (negros) ou outras (rural, ribeirinha, etc.). O presente estudo discute as principais âncoras identitárias de numa comunidade tradicional do pantanal mato-grossense, localizada no município de Santo Antonio do Leverger e denominada Varginha.
METODOLOGIA:
Ao longo do estudo, foram utilizados métodos e técnicas recorrentes no campo da Antropologia como a etnografia, entrevistas semiestruturadas, observações dirigidas, análises documentais e diagnósticos participativos. O trabalho de campo priorizou a identificação do pertencimento e da autoimagem dos moradores sob três perspectivas complementares: a) análise da situação de contato com o entorno regional (Balandier); análise das formas de organização e destinação dos espaços comunitários e da territorialidade (Oliveira Filho); análise do campo de intermediação, das formas específicas de lidar com as instituições tradicionais e daquelas incorporadas no convívio intersocietário (Castoriadis). Foram utilizados recursos audiovisuais para o registro de depoimentos, eventos e situações cotidianas envolvendo homens e mulheres (crianças, jovens, adultos e idosos), de diferentes posições sociais. As informações obtidas, uma vez sistematizadas, resultaram em textos e registros audiovisuais que compõem o relatório final da pesquisa. Alguns produtos obtidos ao longo da pesquisa retornaram à comunidade e estão sendo utilizados como materiais didáticos na escola.
RESULTADOS:
A pesquisa apontou como principais elementos constitutivos da identidade de Varginha as seguintes âncoras: a) Manutenção e incentivo às relações de vizinhança, amizade, compadrio, namoro e casamentos entre os membros da comunidade: b) Rígido controle social na disponibilização e utilização do espaço físico destinado às moradias, lotes (produtivos, de apoio e de reserva), pequenos comércios, equipamentos sociais, áreas de lazer etc.; c) Organização comunitária com atribuição rotativa de encargos para a promoção de eventos anuais como a Festa do Divino Bom Jesus, Siriri e Cururu; d) Promoção regulares de atividades religiosas como missas, procissões, novenas, santos padroeiros, grupo de mulheres, idosos, jovens, catequese para crianças; e) Participação expressiva da comunidade nas atividades escolares por meio de associações, promoção de eventos, gincanas, festas comemorativas, visitas, etc. O principal fator de ruptura e desunião apontado pela comunidade foi a divergência político partidária, especialmente em períodos eleitorais.
CONCLUSÃO:
O estudo concluiu que a comunidade em foco ancora sua identidade nas relações dinâmicas entre os elementos materiais (rio, território, produção, renda) e os elementos culturais (vida social, familiar, religiosa, escolar). A garantia do uso exclusivo do espaço territorial e dos respectivos recursos naturais disponíveis, associado às políticas sociais e de renda, asseguram a reprodução da denominada “economia tradicional”. O controle social (expresso ou velado) de quase todas as atividades cotidianas viabiliza o processo educativo imaginado e consolida o realizado. É, pois, nesse nicho natural e cultural que se sustenta e se reproduz o modo pantaneiro de ser, com o seu falar e com as relações sociais características, sintetizado, em linhas gerais, pelo modo de vida da comunidade de Varginha.
Palavras-chave: Comunidades ribeirinhas, Identidade, Pantanal Mato-Grossense.